Folha de S.Paulo

Fazer parte da renovação

Há oportunida­des reais de mudar o Brasil para melhor

- Ilona Szabó de Carvalho Cientista política fluminense, é mestre em Estudos de Conflito e Paz por Uppsala

“Você construiu uma carreira sólida e vai colocar tudo a perder?” Ouvi muito essa pergunta em 2017. Eu nunca pensei em me candidatar a nada, mas ano passado refleti muito ao lado de parceiros que se dispuseram a encarar a questão da renovação política. Fui provocada pelo meu engajament­o na fundação do Agora, um movimento criado para aproximar cidadãos da política e torná-la mais participat­iva.

Concorrer a cargo eletivo seria o meu melhor papel em 2018? A resposta é não. Mas, ao me permitir pensar sobre isso, mergulhei na questão e interagi ainda mais de perto com o nosso combalido sistema político. Não foi necessaria­mente agradável. Quanto mais próximo você chega dele, mais tem certeza que precisa ser transforma­do, e mais você compreende o quão hercúlea é essa tarefa. O sistema funciona como uma máquina de moer princípios, boas intenções, e nervos. Isso precisa mudar.

A pergunta inicial desse artigo foi feita por pessoas de gerações anteriores à minha, que já tinham descoberto o que acabei por perceber pouco depois. Ao mesmo tempo, outros amigos e pares diziam que me apoiariam caso embarcasse nessa arriscada jornada. Acabei por frustrar alguns deles quando reafirmei minha decisão de cumprir meu papel cívico a partir da sociedade, defendendo causas como segurança pública e justiça social, e atuando no Agora, onde temos o compromiss­o de impactar a agenda pública e de servir em um cargo público e m momento oportuno.

Uma coisa é certa, você não sai dessa reflexão como entrou. A pergunta sobre como transforma­r o sistema político brasileiro me acompanha todos os dias. Não há como ignorá-la. Já pagamos um preço alto demais por nos afastar da política e não podemos deixar que a conta aumente ainda mais para gerações futuras. A importânci­a de candidatur­as sólidas é indiscutív­el, mas o engajament­o político não se limita a concorrer a uma eleição. A política faz parte do nosso dia a dia e precisa perder a conotação negativa que carrega hoje.

Dessa forma creio que o primeiro passo para a transforma­ção política começa dentro de cada cidadão. Entender nosso papel na construção de uma sociedade democrátic­a passa por (re)aprender nossos direitos e deveres no pacto social de convivênci­a em sociedade. Passa também por resgatar valores cívicos como liberdade, responsabi­lidade e solidaried­ade, por se envolver em causas que acredita e atuar de onde quer que esteja. Além disso, considere apoiar com tempo e recursos os corajosos novatos que se lançarão aos leões. Não se candidatar não significa ficar de fora da disputa.

Acredito que a mudança será feita por coalizões plurais, formadas por pessoas de experiênci­as distintas, mas com objetivos comuns pautados no interesse público. Gente disposta a sair da zona de conforto, ouvir, dialogar e construir uma nova visão de Brasil. Isso demanda planejamen­to, tempo e paciência. É preciso focar inicialmen­te as convergênc­ias e entender que agir juntos dá muito mais trabalho do que se opor e jogar pedras. Como não existem salvadores da pátria, precisamos do esforço coletivo para atingir o resultado que queremos.

A renovação política não é apenas um nome, não é uma só eleição. É um conjunto de ideais e de comportame­ntos que devem ser adotados por cada um de nós. Estamos apenas no começo de uma longa estrada. Não estamos sozinhos. Há diversas iniciativa­s de inovação política na América Latina e mundo afora. Sabemos que há riscos gigantesco­s em todos os lugares. Mas temos a certeza de que há oportunida­des reais de mudar o país para melhor. Se para você isso tudo ainda parece um sonho distante ou se quer se engajar e não sabe como, procure um movimento cívico. O ceticismo cederá espaço à esperança.

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