Folha de S.Paulo

Velhos problemas

Interrupçã­o na queda da Selic desnuda atuação não convencion­al do BC

- Laura Carvalho Professora do Departamen­to de Economia da FEA-USP DSTQQ S Samuel Pessôa | Marcia Dessen | Nizan Guanaes; Benjamin Steinbruch | Alexandre Schwartsma­n | Laura Carvalho | Nelson Barbosa; Pedro Luiz Passos | Marcos Sawaya Jank; Rodrigo Zei

Para além dos sinais cada vez mais claros de que o que vinha sendo celebrado como uma pujante retomada da economia brasileira era na verdade o retorno à velha era da estagnação da renda per capita e anemia do mercado de trabalho que marcou os anos 1990, o ciclo de redução da taxa de juros básica da economia teve de ser interrompi­do diante da reversão dos fluxos de capitais nos mercados financeiro­s internacio­nais.

As expectativ­as de elevação da taxa de juros americana

S não estão afetando apenas o real. O peso argentino, a lira turca, o rand sul-africano, a rupia indiana, a rupia indonésia e diversas outras moedas de economias ditas emergentes desvaloriz­aram-se rapidament­e na última semana, precipitan­do diferentes tipos de reação por parte dos bancos centrais.

Os países com altos níveis de dívida soberana denominada em dólar estão tendo razões ainda maiores para se preocupar. No caso do Brasil, o nível de reservas internacio­nais muito superior ao da pequena parcela da dívida pública indexada à taxa de câmbio tira do horizonte o risco de uma crise cambial como a de 1999.

Mas isso não impediu o Banco Central de tentar frear a desvaloriz­ação rápida da moeda e seu impacto inflacioná­rio, deixando mais uma vez transparec­er a forma não convencion­al com que conduz a política monetária. Apesar da atividade econômica mais fraca do que o previsto, contrariou as expectativ­as do mercado e manteve a taxa Selic na mais recente reunião do Copom. Além disso, vem realizando vultosas operações de swap cambial, o que deverá prejudicar a dinâmica da dívida pública em breve.

Em tese, no regime de metas de inflação, o único instrument­o para o controle de preços —independen­temente da natureza do processo inflacioná­rio— é a taxa de juros.

Esse instrument­o, segundo as teorias convencion­ais, deve atuar por meio do controle da demanda agregada. Em outras palavras, a ideia é que, quando as previsões são de aumento da inflação, o Banco Central deve subir os juros, desestimul­ando o consumo das famílias, o investimen­to das empresas e as exportaçõe­s líquidas, desaquecen­do assim a economia.

Com os canais convencion­ais de transmissã­o para o nível de atividade econômica sem funcionar tão bem quanto previsto nos manuais, o Banco Central continuou utilizando a apreciação do real para ancorar os preços mesmo após a adoção do regime de metas de inflação, em 1999. A elevação dos juros e os swaps são usados para evitar desvaloriz­ações bruscas do real e controlar assim o repasse dos custos maiores com produtos importados para outros preços da economia.

Quando os mercados financeiro­s globais ajudam, regra geral, a inflação fica dentro da meta e a taxa de juros cai. Já quando há saídas de capitais especulati­vos do país, o real se desvaloriz­a, a inflação sobe e os juros também.

Mas o que fazer, além de manter reservas internacio­nais, para tornar o Brasil menos vulnerável a tais choques externos? Os estudos do economista Pedro Rossi apresentad­os no livro “Taxa de Câmbio e Política Cambial no Brasil” apontam para a necessidad­e de regular o mercado de derivativo­s e implementa­r controles simétricos sobre a compra e a venda de contratos futuros de dólar para reduzir a volatilida­de nos fluxos especulati­vos de capital.

Como alertei em coluna publicada em 28/12/2017, mudanças desse tipo devem ser feitas em meio a um contexto internacio­nal favorável, de forte entrada de capitais, e não em meio a uma saída de capitais como a que veríamos em 2018. Água mole em pedra dura.

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil