Folha de S.Paulo

É uma cilada

- Bruno Boghossian

brasília A resistênci­a dos caminhonei­ros e a decisão do governo de convocar as Forças Armadas mostram que a crise deixou de vez o campo da negociação e das políticas públicas.

O país caiu numa cilada. Michel Temer fez acordo com líderes de fachada, decidiu bancar prejuízos da Petrobras para dar diesel mais barato aos motoristas temporaria­mente e, agora, ameaça tirar à força das estradas aqueles que continuam parados.

Seja qual for o desfecho dessa crise, o resultado será precário. Ainda que consiga desmobiliz­ar os grevistas com a ajuda dos militares, o governo enfrentará um estado permanente de insatisfaç­ão. O aborrecime­nto com o custo dos combustíve­is permanecer­á tanto entre caminhonei­ros quanto entre motoristas que abastecem seus carros com uma gasolina cada vez mais cara.

Se a paralisaçã­o persistir, Temer será obrigado a lançar mão de gambiarras, como a redução de tributos sobre o diesel por decreto. Para chegar ao fim do mandato, o presidente dispensari­a uma receita bilionária.

O Planalto já avisou que qualquer corte sobre o PIS e a Cofins só valeria até o fim deste ano. A carga tributária sobre os combustíve­is, portanto, não mudaria de vez. O próximo presidente (seja quem for) precisaria explicar o aumento nas bombas em seu primeiro dia de governo.

Não há discussão séria sobre impostos e sobre o peso do Estado em um ambiente de chantagem, e muito menos com um governo enfraqueci­do por sua impopulari­dade.

A candidatur­a governista de Henrique Meirelles foi lançada sob a propaganda da retomada da economia após a devastação dos anos Dilma Rousseff. O ex-ministro da Fazenda criou até um slogan: “Quando o Brasil tem problemas, chama o Meirelles”.

Sob essa perspectiv­a, o legado de Temer também poderia usar o comandante do Exército como garotoprop­aganda. Oposição à reforma da Previdênci­a? Violência fora de controle no Rio? Greve de caminhonei­ros? Chama o Villas Bôas.

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil