Folha de S.Paulo

Haitianos que viviam na Venezuela chegam ao Brasil, fugindo da crise

- Fabiano Maisonnave

boa vista (rr) O comerciant­e Jean Naive Baroh, 49, está entre os milhares que fugiram da crise econômica venezuelan­a. Mas, ao contrário da maioria dos milhares de imigrantes em Roraima, não é a primeira vez que isso ocorre com ele, que é haitiano.

Até algumas décadas atrás, a Venezuela estava entre os países que mais recebiam imigrantes na região. Em 2015, 4,5% da população de 32 milhões havia nascido fora.

No Brasil, esse percentual é de 0,3%, segundo relatório feito em parceria entre o Mercosul e a OIM, o organismo da ONU para migração.

Com a crise dos últimos anos, o fluxo se reverteu, principalm­ente para a Colômbia. O geógrafo Antonio de Liso, da UCV (Universida­de Central da Venezuela), estima que ao menos 25% do 1 milhão de pessoas que cruzaram para o país de Gabriel García Márquez tem laços familiares ali.

No entanto, a falta de oportunida­des no país natal tem levado os cerca de 6.500 haitianos na Venezuela a buscar outros destinos. “Lá no Haiti não tem emprego”, diz Baroh, que veio ao Brasil com um grupo de 40 compatriot­as.

Em Boa Vista, ele compartilh­a uma casa de dois quartos com outros 14 haitianos adultos, além de várias crianças nascidas na Venezuela.

Há três meses no Brasil, ele se mantém vendendo farinha de milho para arepas e Pirulin (canudos cheios de chocolate), produtos típicos venezuelan­os. As ofertas ficam em uma mesa na frente de casa – ele mora ao lado de um abrigo administra­do pelo Exército.

Desde que está no Brasil, já viajou duas vezes a Caracas, onde vivia desde 2000, para levar comida à mulher e duas filhas. Baroh conta que vivia bem até alguns atrás. Era dono de duas empresas de vendas de roupa, ambas falidas. Além disso, teve uma de suas duas casas invadidas há três anos por pessoas que teriam laços com o governo.

O comerciant­e afirma que, até se estabiliza­r, não trará a sua família. “Não tem emprego em Boa Vista. A gente pensa que, estando legalizado no país, pode conseguir um trabalho para sobreviver, mas não é assim.”

A Venezuela foi um dos países que facilitara­m a entrada de imigrantes haitianos após o terremoto de 2010.

Na América do Sul, só recebeu menos do que o Brasil (67 mil) e o Chile (18 mil), segundo o relatório Mercosul/OIM.

A reportagem da Folha solicitou à Polícia Federal o número de haitianos que entrou no Brasil por meio da fronteira com a Venezuela, mas não obteve resposta.

O comerciant­e ainda não sabe se continuará mais tempo em Boa Vista ou se tentará a sorte em outro local. Mas voltar a Caracas não é uma opção. “Pela situação da Venezuela, estamos melhor aqui. Não dá para viver lá.”

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Eduardo Anizelli/Folhapress O haitiano Jean Baroh em Boa Vista

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