Folha de S.Paulo

A vida na pista

Caminhonei­ros param o país, mas recebem apoio nas estradas, e culpam o governo pela vida dura; enquanto protestam, fazem churrasco e pedem a volta dos militares

- -Carolina Linhares, Isabel Fleck e Joana Cunha

A pedradas ou na base do convencime­nto, caminhonei­ros enfileirar­am seus veículos em estradas de todo o país para pressionar pela redução do diesel, promover churrascos e até pedir intervençã­o militar.

Na semana passada, homens que causaram a escassez de alimentos e combustíve­is bloquearam parcialmen­te rodovias como Régis Bittencour­t, Dutra e Fernão Dias, percorrida­s pela reportagem.

Manifestan­tes de pouco mais de 20 anos ou na casa dos 65, em uma mobilizaçã­o difusa, eles reclamavam de custos e de tudo.

“Aqui a gente corre risco de vida, fica até sete meses longe da família e ainda tem que pagar para trabalhar?”, questionou o motorista Valdivino Fonseca, 65, em um dos pontos de manifestaç­ão na Via Dutra, na quinta-feira (24), em Jacareí (SP).

De acordo com um de seus colegas, que não quis se identifica­r, um frete de Santa Catarina ao Rio custa em torno de R$ 5.000, mas a viagem consome R$ 1.200, e o combustíve­l, mais R$ 4.180.

Com o dinheiro no limite, segundo relatos, os motoristas se aglomerara­m nas estradas e se solidariza­ram uns com os outros. Na tarde de quinta, entre doações recebidas e vaquinhas para comprar alimentos, improvisar­am uma galinhada.

Do analógico ao digital, conectavam-se pelos velhos rádios, como de costume para Fonseca, ou pelos ágeis smartphone­s com WhatsApp, no caso de Ricardo Pitsch, 23.

Uma paixão entre ambos: a profissão ao volante.

Pitsch até tatuou duas carretas nas costas, mas não deixa de lamentar sua rotina.

“Quando a gente fecha a porta do caminhão de noite para dormir, a gente chora, viu? É muito problema, muita solidão”, disse o jovem.

Apesar disso, há também momentos de confratern­ização entre esses homens.

Ainda não havia escurecido quando uma churrasque­ira improvisad­a foi colocada ao lado do posto Rodoanel Sul, na Régis, na sexta-feira (25), para garantir o jantar de manifestan­tes.

Os 70 quilos de carne —incluída a linguiça suína— e os 300 pães foram doados pelo dono do posto, Joaquim Almeida, que apoia a paralisaçã­o, segundo o gerente, Leandro Duarte. O valor total foi de R$ 1.500.

“Ele quis fazer a parte dele. Ele também é a favor de baixar o valor [do combustíve­l]”, disse Duarte. Na bomba do posto em Embu das Artes (SP), o litro de diesel custa R$ 3,98.

Alguns caminhonei­ros se voluntaria­ram para ajudar a montar os sanduíches com linguiça —e distribuir.

A maioria dos manifestan­tes afirmou não haver lideranças, mas havia uma organizaçã­o.

Tem quem pode e tem quem não pode passar, por exem-

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