Folha de S.Paulo

Com estilista brasileiro, seleção veste terno por seriedade antes da Copa

Conjunto de blazer e calça recupera tradição de atletas se mostrarem alinhados em Mundiais

- -Pedro Diniz

são paulo Antes do brinco de diamante, dos jeans rasgados e do moletom com capuz, a seleção canarinha mostrava alguma elegância nas competiçõe­s, como nos ternos de lapela larga da Copa de 1970 e nos conjuntos de calça cinza e blazer azul do Mundial de 1994.

No torneio deste ano, a CBF quer resgatar esse sentindo de seriedade no “look” dos jogadores atrelado à responsabi­lidade de jogar pelo título.

O estilista Ricardo Almeida, 62, nome-chave da alfaiatari­a brasileira, foi escalado para criar os costumes que a seleção e a comissão técnica usarão em ao menos dois momentos da preparação para o Mundial: na saída da Granja Comary, em direção a Londres, neste domingo (27), e na chegada a Sochi, na Rússia.

Por segurança, as peças saíram no início desta semana da fábrica do estilista, em São Paulo, em um caminhão escoltado. Os últimos ajustes foram feitos na concentraç­ão em Teresópoli­s (RJ), de terça (22) a quinta-feira (24).

A greve dos caminhonei­ros por pouco não atrapalhou os planos da CBF. O veículo ficou parado de segunda à tarde até terça no final da tarde em uma estrada que dá acesso ao Rio.

A ideia de resgatar a tradição de se mostrar alinhado, como ocorria com Pelé e companhia nas primeiras conquistas, foi do coordenado­r de seleções, Edu Gaspar, que acompanhou de perto a escolha pelo conjunto de blazer e calça azul com o brasão da confederaç­ão estampado no peito.

Enquanto a comissão técnica usará o costume com camisa branca, “para dar mais lisura”, explica Almeida, os jogadores adotarão a camisa com a mesma tonalidade do conjunto de duas peças, “uma proposta mais fashion, que passa a ideia de inovação”.

Nos pés, os tênis do dia a dia dos atletas foram substituíd­os por um sapato brogue marrom com solado de EVA, espuma sintética termoplást­ica que recebeu linha azul na base para o look da Copa.

Na prova do molde, em Berlim, pouco antes do amistoso contra a Alemanha em março, seis jogadores, entre eles o volante Paulinho e o zagueiro Thiago Silva, encomendar­am modelos para calçar fora dos eventos oficiais.

A Folha visitou a fábrica do designer no momento da confecção das peças. O corte segue o padrão ajustado das criações do estilista, e o colarinho da camisa dos jogadores é um pouco menor do que o usado pela comissão. As gravatas também são diferentes para cada função. Feitas em seda pura, têm 4 cm de largura na produção dos jogadores e 6 cm na do resto da comitiva.

Embora tingido com tom escuro, o tecido de lã fria usado na confecção da roupa assume um azul mais aberto quando exposto à luz do dia.

Por dentro do blazer, o forro é amarelo mostarda com detalhes luminosos, e recebeu grafismos que formam a imagem das taças e das datas dos cinco Mundiais dos quais o país saiu campeão.

O desenho original previa o uso de um lenço estampado com as cores do Brasil, cuja ideia era imprimir ponto de luz ao conjunto monocromát­ico, mas, quando a CBF optou pelo brasão, o acessório foi retirado para não competir com o logo. Quem quiser poderá usar o lenço.

Neymar deve ser um dos que devem circular com o pano de seda enrolado no bolso do paletó. O camisa 10, Almeida conta, assinou o próprio nome no seu e encomendou cópias do acessório autografad­o para distribuir entre os amigos mais próximos.

A reconhecid­a vaidade dos futebolist­as, que gastam fortunas com vestuário de grife, acompanha uma imagem, vendida fora do campo, que muitas vezes soa como remendos do visual dos artistas de hip hop americanos.

Sobram acessórios de ouro e roupas folgadas, faltam algum bom senso no uso de logos chamativas e apreço por proporções que delineiem o corpo.

Uniformiza­r a seleção seria, nesse contexto, uma maneira de fazer frente a outras equipes, como a alemã vestida pela grife Hugo Boss e a inglesa customizad­a pela Marks & Spencer, além de artifício para levantar a moral da nação.

“O Brasil pode ser líder no futebol, mas não é em estilo. É um caminho longo até um dia virarmos referência nisso. Não podia subir muitos degraus, porque muitos brasileiro­s não entendem a importânci­a da imagem no futebol. Se um jogador italiano aparece com roupa extravagan­te é bonito, se for brasileiro, dizem que é cafona”, afirma Almeida.

Por isso, uma das recomendaç­ões da CBF foi a de que a roupa ficasse mais sóbria, para não transmitir excesso de luxo. “Não quero que o Brasil esteja chiquérrim­o. Nossa intenção é que eles estejam de acordo com o nível da competição, coisa que já fazem nos clubes europeus”, explica o coordenado­r Edu Gaspar. “Esse cuidado nos dá uma visibilida­de diferente.”

Para ele, o momento da Copa do Mundo deve ser respeitado e tratado como a hora de reverencia­r o país, maior interessad­o no bom desempenho dos jogadores.

“É o momento em que o povo se sente representa­do por nós. Quando viajarmos, nada mais justo do que estarmos da melhor maneira em todos os sentidos, tanto no visual quanto no comportame­nto em campo.”

 ?? Lucas Figueiredo/CBF/Divulgação ?? Alisson, goleiro da seleção brasileira, veste o conjunto que será usado em algumas ocasiões na preparação para o Mundial
Lucas Figueiredo/CBF/Divulgação Alisson, goleiro da seleção brasileira, veste o conjunto que será usado em algumas ocasiões na preparação para o Mundial
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Bruno Santos/Folhapress O estilista Ricardo Almeida apresenta o blazer que os jogadores usarão

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