Melhor é impossível
Quando somos jovens, dez anos são muitos anos. Ainda me lembro: teria uns 20 e a ideia de ter 30 era, simultaneamente, remota e assustadora. Quando cheguei aos 30, os 40 já eram menos remotos mas mais assustadores. Sobretudo porque o tempo passava mais rápido e eu ainda me lembrava de ter chegado aos 20 na semana anterior. Hoje, com 40 e mais uns trocos (41, pronto, quase 42), olho para os 50 (para os 51, pronto, quase 52) e sei que lá estarei amanhã de manhã. Meio século de vida: não é possível. A festa só começou. E depois, com o meu incurável narcisismo, vou desbobinando as enciclopédias masoquistas em contagem decrescente: Mozart morreu aos 35; Charlie Parker aos 34; Keats aos 26. E eu? Que fiz eu aos 50? Os amigos entram em cena: Saramago despontou para a literatura aos 60! Ainda tens dez anos! É isso que gosto nos meus amigos: o talento para a mentira piedosa. Eles é que merecem o Nobel. Lamento, Serafina: não sei como será o mundo daqui a uma década. Imagino que o cenário será outro —carros sem motorista; um robô em cada casa; Viagra na pasta de dentes. Mas se o passado ensina alguma coisa é que nós, humanos, continuaremos a ser o mesmo caos patético de sempre. Inseguros, invejosos, assustados. Mas também capazes de amar, sonhar e criar. Quando penso no mundo futuro, não é no mundo que eu penso. É no meu mundo. Na minha tribo. Os meus amores, os meus amigos. E até os meus inimigos, sem os quais a vida perderia qualquer encanto. Se eu e eles estivermos por cá quando eu chegar aos 50 anos (ok, desisto: 52), garanto ao leitor que melhor é impossível.