Nem tudo se resume à rentabilidade
Decisões de investimento baseadas apenas em rentabilidade não terminam bem
Os investidores tradicionais e
conservadores que investem em renda fixa, absoluta maioria dos brasileiros, têm sido
bombardeados com propaganda, mensagens e abordagens comerciais que questionam sua inteligência.
“Os juros caíram pela metade e você não vai fazer nada?”, “existem alternativas muito mais rentáveis e você não quer?”, “a poupança é tão ruim que nem dá pra chamar de investimento!”
A coitada da poupança, então, apanha todo santo dia
dos incansáveis algozes que tentam demonstrar por A + B as vantagens de investimentos mais rentáveis disponíveis no mercado.
Os argumentos invariavelmente alegam que os juros caíram mais de 50% (verdade) e que por essa razão o investidor deve mudar para investimentos mais rentáveis, como fundos multimercado.
“Mas a rentabilidade dos fundos multimercado não caiu também?”, questiona o tímido investidor, inseguro e receoso de navegar por águas nunca dantes navegadas.
Claro que sim! Com a redução da taxa de juros básica da economia, caiu a rentabilidade de todos os fundos que investem em juros, inclusive os
multimercado, cuja carteira é composta majoritariamente por títulos de renda fixa. A
rentabilidade mensal média foi cerca de 15% em três anos, 12% em dois anos e 9% em um ano.
Será que o investidor está disposto a correr mais risco para tentar ganhar mais? Será que o ganho adicional (incerto) é considerado adequado
e suficiente para que o investidor faça esse movimento? Será que o investidor está sendo orientado em relação aos riscos do investimento potencialmente mais rentável? Será que ele entende que existe uma curva de juros de médio e longo prazo que impacta o valor dos ativos mesmo que a taxa Selic permaneça estável?
Momento atual, por exemplo, taxa Selic ( juros de um único dia) estável e taxa de juros prefixada ( juros de muitos anos) subindo provocam desvalorização dos ativos de taxa
prefixada.
Quem não aceita volatilidade prefere aplicações de taxa pós-fixada que remunera sempre a taxa de mercado (Selic ou CDI), para evitar o risco de desvalorização.
Não sou contra a reflexão de repensar a estratégia de investimento, pelo contrário, acho que essa é uma avaliação que deve ser feita sempre, em qualquer cenário.
O que me incomoda e sei que incomoda muitas pessoas tam
bém, pelas inúmeras mensagens de leitores que recebo, é a maneira como essa abordagem tem sido feita.
Falta transparência em alguns discursos, talvez na maioria deles. Falar dos riscos e de eventuais perdas não é nada sedutor, então o discurso fica pela metade, comprometendo a análise e a decisão do investidor.
Rentabilidade é apenas um
dos atributos que o investidor busca quando investe. A segurança, outro atributo de um investimento, parece falar mais alto no caso brasileiro. Liquidez, terceiro e último atributo que o investidor deve considerar, tende a ser sacrificada nas operações mais rentáveis. A concentração de recursos na renda fixa, inclusive na poupança, parece ser uma evidência cristalina de que a decisão do poupador e do investidor brasileiro está ancorada muito mais na segurança do que na rentabilidade.
Aos agentes comerciais recomendo, antes de indicar um produto, conhecer o investidor, seus objetivos e receios, identificar o que de fato é importante para ele. Quando esse diagnóstico é ignorado, a história não acaba bem. Ao investidor, siga seus instintos. Se alguma
coisa te incomoda, evite.