Folha de S.Paulo

A paralisaçã­o precisa acabar, não interessa a mim, ao Brasil, o caos

Presidenci­ável nega influência sobre manifestan­tes e rejeita intervençã­o militar ou derrubada do governo

- -Igor Gielow

são paulo O presidenci­ável Jair Bolsonaro (PSL) afirma que a paralisaçã­o dos caminhonei­ros já chegou ao seu ápice e precisa acabar. “Não interessa a mim, ao Brasil, o caos agora”, afirmou.

Em entrevista à Folha ,odeputado negou ter ligação com suas lideranças, especulaçã­o que cresceu nos últimos dias devido à presença frequente de apoiadores de sua candidatur­a entre os manifestan­tes.

Por “caos” ele exemplific­ou a ideia de derrubada do presidente Michel Temer (MDB). “Se faltasse um ano e meio, dois, três, tudo bem, pô.”

Bolsonaro repeliu a defesa de intervençã­o militar esposada por vários dos caminhonei­ros em faixas, grupos de WhatsApp e bloqueios. “Se tiver de voltar [os militares], que volte pelo voto”, disse, para não “dar essa bandeira para o PT dizer que foi golpe, porque aí foi golpe mesmo”, afirmou.

O presidenci­ável falou pela primeira vez na paralisaçã­o em sua conta no Twitter na segunda (21). Ele deu apoio aos caminhonei­ros e prometeu revogar eventuais multas caso eleito em outubro, mas criticou bloqueios de estradas.

Sua inflexão pelo fim do movimento ocorre no momento em que estão se agudizando os efeitos do desabastec­imento em centros urbanos.

A modulação está em linha com o que defendem alguns de seus estrategis­tas, que temem a associação da imagem do deputado à de um radical.

Como o sr. vê o movimento dos caminhonei­ros? Caso eu fosse presidente, isso não teria acontecido, pois há dois anos eu acompanho o movimento dos caminhonei­ros. Estive com eles em Gramado, no Rio e em Brasília. Nos últimos dias, o sr. foi o personagem político mais associado ao movimento. Como

se deu isso? Eu não participei da eclosão do movimento. O Temer resolve agora isentar o pedágio por eixo levantado por MP, isso é uma reivindica­ção antiga deles, que eu conhecia. Eu vejo críticas na mídia de que o Temer está passando por cima de um contrato, mas não é um ato jurídico perfeito. Se é uma cláusula leonina, ela pode ser questionad­a na Justiça.

O que faltou? Faltou bom senso por parte do governo e por parte das empresas que exploram o governo. Há a questão do preço extorsivo do pedágio. A lombada eletrônica é outro problema. Deve ter mais de mil lombadas na BR-116, e isso vai para o frete, e acaba no preço do feijão que compramos no mercado.

Outro problema deles é a condição das estradas. E, em especial no Sudeste, roubo de carga. O prejuízo anual está na casa do R$ 1,5 bilhão, eu ouvi em reuniões em Brasília. E o governo não manda um representa­nte nessas reuniões. O sr. se disse contrário a bloqueios, mas apoiou o movimento. A paralisaçã­o chegou a um ponto em que, refluindo ou não, está afetando a população na ponta. Como fica o apoio? Eu estou conversand­o com, não digo lideranças, mas gente deles. Não existe liderança, tem muito voluntaris­mo. Eu estou dizendo para eles que isso é igual a remédio, se tomar demais, vira veneno.

A Federação Única dos Petroleiro­s anunciou uma greve para quarta, mas sem pauta nenhuma, não estavam negociando nada com o governo. É uma greve para voltar a Dilma? Pelo Lula livre? Isso é a pauta da esquerda, a pauta do caos.

Eles estão sabendo que, se morrerem centenas de milhares de galinhas por falta de ração, para aquela granja voltar a ter galinha, são seis meses. Isso vai encarecer o ovo.

A coisa chegou num ponto que precisa refluir. Aí entra o aspecto político. Não interessa, acredito eu, para mim, para o Brasil, para quem quer a democracia, o caos agora.

Querem tirar o Temer? A eleição está chegando, faltam cinco meses. Se faltasse um ano e meio, dois, três, tudo bem, pô. Estão faltando poucos meses. Por isso eu estou batendo na tecla de que a lei do voto impresso precisa ser cumprida, acabar com aquela suspeição sobre fraude.

E como o sr. vê o pedido de intervençã­o militar? Isso vem de um grupo pequeno. No desespero, cara, você pede qualquer coisa. Na minha opinião, dos meus amigos generais, se tiver de voltar um dia, que volte pelo voto. Aí chega com legitimida­de, não dá essa bandeira para o PT dizer “Abaixo a ditadura” ou “Foi golpe”, porque aí foi golpe mesmo.

Não passa pela minha cabeça e eu não vi isso passar pela cabeça de nenhum general.

O que o pessoal tem saudade é dos valores, era uma época diferente. Hoje tem um desgaste de valores. Aí o [ex-governador paulista e presidenci­ável tucano Geraldo] Alckmin aceitou a questão de que qualquer pessoa que se sinta mulher vai para banheiro feminino [resolução de 2014 garante o uso de sanitários em escolas públicas baseado na declaração de gênero].

Que porra é essa, pô? Eu tenho uma filha, ela vai no banheiro e vai ter um cara balançando o peru lá dentro? Querem que eu aceite? A mulher que se sente homem não vai no banheiro dos homens. Duvido que uma mulher gay, bonita, vá no banheiro dos homens na rodoviária.

O sr. acha que a paralisaçã­o passou do limite? Ninguém quer o caos. Quem quer o c ao sé a esquerda, acu saros latifundiá­rios, os empresário­s, os americanos. Querem pretexto. No que depender de mim, ninguém vai dar pretexto de fazer uma falta. Não tem uma bandeira vermelha [entre os manifestan­tes], estão de parabéns. Se querem ir para afrente de quartel, tudo bem. Quem garante a liberdade e a democracia são os militares.

Se eu puder dar um recado para o movimento, acorda esticou, todos vão perder. Até o que o caminhonei­ro vai ganhar com o diesel, vai perder com o empurrão na inflação.

Até aqui estou com eles, chegou ao ápice, não exerço influência. Até porque em grande parte o governo entendeu que eles tinham razão, podemos voltar à normalidad­e. Eles mostraram que a população está ligada na questão dos tributos escorchant­es no país. Há algum tipo de insubordin­açãoentrem­ilitares? O sentimento que eu tenho da tropa é de que ninguém quer ir para o confronto.

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