Folha de S.Paulo

Gilmar indicou não ser responsáve­l por caso Paulo Preto no STF

- -José Marques

Vinte dias antes de conceder o habeas corpus que livrou o engenheiro Paulo Vieira de Souza da prisão pela primeira vez, o ministro Gilmar Mendes sugeriu que não era, necessaria­mente, o responsáve­l pelo caso no STF (Supremo Tribunal Federal).

A avaliação foi feita quando o ministro negou um dos recursos da defesa de Souza, mais conhecido como Paulo Preto. Ex-diretor da Dersa (estatal paulista de transporte­s), ele é apontado como operador de propinas do PSDB paulista.

Apesar da negativa inicial, em recurso seguinte, o pedido de habeas corpus, o ministro soltou Paulo Preto sem voltar a tocar no assunto da responsabi­lidade pelo processo.

Isso tudo aconteceu entre abril e o início de maio, antes de Paulo Preto ser novamente preso na última quarta-feira (30). Horas depois, ele foi solto mais uma vez por decisão de Gilmar Mendes.

Essa primeira prisão preventiva de Souza na Lava Jato aconteceu no dia 6 de abril, por, segundo o Ministério Público Federal, ele ter ameaçado uma ré colaborado­ra.

Souza havia sido denunciado sob suspeita de R$ 7,7 milhões nas obras do Rodoanel pela Procurador­ia, que teriam de ser destinados ao realojamen­to de moradores da região das obras viárias.

No Supremo, ele é investigad­o em outro inquérito relacionad­o ao senador e ex-governador de São Paulo José Serra (PSDB). A investigaç­ão foi aberta após as delações da Odebrecht —em questões relativas a esse caso, Gilmar é o ministro responsáve­l.

Foi em um recurso nesse processo que a defesa de Souza pediu a Gilmar que determinas­se o envio do caso do Rodoanel da primeira instância para o STF. Segundo os advogados, havia conexão com a denúncia apresentad­a em São Paulo. Também pediram que a prisão fosse revogada.

Gilmar negou o pedido no dia 19 de abril, sob justificat­iva de que não via essa conexão. “O reclamante [Paulo Preto] foi denunciado, juntamente com outras pessoas sem prerrogati­va de foro, por ‘desvios de recursos públicos do Programa de Reassentam­ento dos empreendim­entos do Rodoanel Sul, Jacu Pêssego e Nova Marginal Tietê’”, disse Gilmar.

“Não se indica suspeita concreta quanto a autoridade com prerrogati­va de foro”, acrescento­u. “Assim, numa primeira vista, o objeto da investigaç­ão e da ação penal é diverso. A tese da defesa, no sentido de que a conexão decorre do PIC [Procedimen­to Investigat­ório Criminal] 944, precisa ser melhor esclarecid­a.”

No dia 8 de maio, no entanto, a defesa entrou com o pedido de habeas corpus. O processo foi considerad­o conexo e distribuíd­o pela secretaria do Supremo para o ministro.

Três dias depois, o habeas corpus foi concedido a Souza, sem Gilmar levantar a questão a respeito de quem seria o julgador responsáve­l pelo caso.

Em sua fundamenta­ção, critica a possibilid­ade de Vieira estar preso para ser forçado a oferecer um acordo de delação premiada. “Como ponto culminante do desvio de finalidade da prisão preventiva, produzem-se notícias buscando constrange­r o Poder Judiciário a compactuar com a ilegalidad­e”, e cita coluna de Mônica Bergamo, da Folha, que informa que o exdiretor estudava a possibilid­ade de colaborar.

A Folha mostrou as duas decisões de Gilmar a especialis­tas em direito penal, que disseram que o procedimen­to é incomum, porque em geral o julgador analisa se seria ou não designado para o caso.

Procurado, o STF informou os motivos para o processo ter sido distribuíd­o ao ministro. De acordo com o artigo 69 do regimento da corte, “a distribuiç­ão da ação ou do recurso gera prevenção [designação] para todos os processos a eles vinculados por conexão ou continênci­a”.

Gilmar não se manifestou. A defesa de Souza tem negado que ele tenha cometido qualquer irregulari­dade.

Na quarta, quando Souza foi solto pela segunda vez, a procurador­a Adriana Scordamagl­ia disse que “causou estranheza o teor da decisão” que veio de “ministro que não faz parte da relação processual ao qual estamos integrando”.

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