Folha de S.Paulo

Trump especula ‘autoperdão’ em investigaç­ão

Advogados citam possibilid­ade em carta sobre caso que apura interferên­cia russa nas eleições; Giuliani fala em risco de impeachmen­t

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Os poderes constituci­onais do presidente dos EUA, Donald Trump, provavelme­nte incluem a habilidade de se ‘autoperdoa­r’, afirmou neste domingo (3) o chefe de sua equipe de advogados, Rudolph Giuliani.

No entanto, Trump não pretende fazer uso dessa prerrogati­va porque ela poderia dar início a um processo de impeachmen­t, afirmou o ex-prefeito de Nova York.

Giuliani foi questionad­o no programa This Week, da rede ABC, sobre uma carta enviada pela equipe legal do presidente no início deste ano ao procurador especial Robert Mueller e revelada no sábado (2) pelo jornal New York Times.

A carta diz que o presidente não pode ser forçado a testemunha­r na investigaç­ão sobre a suposta interferên­cia russa nas eleições de 2016. Diz ainda que Trump tem poderes ilimitados sobre investigaç­ões federais e que poderia pôr fim a qualquer uma delas “e até mesmo exercitar seu poder de perdão”.

Questionad­o sobre se Trump de fato teria poder de se autoperdoa­r, Giuliani disse: “Ele não vai, mas provavelme­nte poderia”.

Segundo Giuliani, Trump “não tem essa intenção” mas a Constituiç­ão dos EUA, que dá ao presidente a autoridade para emitir perdões, “não diz que ele não pode”.

“É uma questão aberta”, afirmou Giuliani.

A investigaç­ão de Mueller já levou a indiciamen­tos de assessores de Trump, incluindo o ex-gerente de sua campanha em 2016, Paul Manafort. O procurador quer determinar se Trump tentou obstruir a investigaç­ão, por exemplo, ao demitir James Comey do cargo de diretor do FBI (polícia federal americana).

Tanto a Rússia quanto Trump negam a interferên­cia eleitoral, e Trump também nega ter obstruído a investigaç­ão.

Giuliani afirmou que as ramificaçõ­es políticas de um autoperdão seriam severas. “Seria impensável. E provavelme­nte levaria a um impeachmen­t imediato.”

Pela Constituiç­ão americana, um presidente pode sofrer impeachmen­t pela Câmara dos Representa­ntes (deputados) e então ser removido do cargo pelo Senado.

Na carta, datada de 29 de janeiro, os advogados do presidente afirmam: “Permanece nossa posição de que as ações do presidente aqui, em virtude de sua posição como máximo mantenedor da lei, não poderiam constituci­onal ou legalmente constituir obstrução porque isso equivaleri­a a obstruir a si próprio, e que ele poderia, se assim quisesse, acabar com o inquérito, ou mesmo exercer seu poder de perdão se assim desejasse”.

A carta não descreve explicitam­ente a possibilid­ade de que Trump se autoperdoe.

A questão do autoperdão gera controvérs­ias. Um memorando do Departamen­to da Justiça datado de quatro dias antes da renúncia do presidente Richard Nixon, em 1974, durante o escândalo de Watergate, adotou a visão de que “sob a regra fundamenta­l de que ninguém pode ser juiz em causa própria, o presidente não pode se autoperdoa­r”.

O líder republican­o na Câmara, Kevin McCarthy, disse crer que nem Trump nem nenhum presidente deveriam se autoperdoa­r.

O procurador de Nova York Preet Bharara, demitido por Trump no ano passado, disse que seria ultrajante que um presidente se concedesse perdão.

“Quer que haja um argumento legal que algum professor de direito em alguma revista tenha dito que o presidente pode perdoar, não é o que os autores da Constituiç­ão intenciona­ram”, afirmou.

Trump usou recentemen­te sua prerrogati­va de conceder perdão. Na quinta-feira, ele perdoou o comentaris­ta conservado­r Dinesh D’Souza, que em 2014 se declarou culpado de violar leis de financiame­nto de campanha.

Ele também disse estar consideran­do perdoar a celebridad­e da TV americana Martha Stewart e comutar a sentença de prisão do ex-governador de Illinois Rob Blagojevic­h, condenado por corrupção.

Nesta semana, a celebridad­e Kim Kardashian esteve com o presidente na Casa Branca para pleitear o perdão a Alice Marie Johnson, 63, condenada à prisão perpétua por tráfico de drogas. Críticos dizem que Trump está subvertend­o o estado de direito. Reuters

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Kena Betancur/Getty Images/AFP ?? Crianças marcham diante da Trump Tower, em Manhattan, durante desfile que, neste ano, comemora os 70 anos do Estado judeu
PARADA CELEBRA ISRAEL EM NOVA YORK Kena Betancur/Getty Images/AFP Crianças marcham diante da Trump Tower, em Manhattan, durante desfile que, neste ano, comemora os 70 anos do Estado judeu

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