Folha de S.Paulo

Uma abertura comercial inteligent­e

É preciso, antes de tudo, fazer reformas estruturai­s

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João Carlos Marchesan

Presidente do Conselho de Administra­ção da Abimaq (Associação Brasileira da Indústria de Máquinas)

A maior abertura do Brasil ao comércio internacio­nal —com redução linear de alíquotas do imposto de importação, como tem sido defendida publicamen­te por representa­ntes do governo— não se caracteriz­a como uma solução absolutame­nte razoável para a inserção do Brasil no livre comércio.

Há décadas temos estudado a questão do desenvolvi­mento do país e do cresciment­o da indústria. Em todos os debates, a conclusão é que a questão central não está na simples redução da alíquota em si, mas essencialm­ente chegar a condições de competição isonômicas.

Para reduzir os custos dos investimen­tos e aumentar a competitiv­idade da indústria brasileira, além de ampliar o comércio internacio­nal, representa­ntes do governo e alguns economista­s defendem sumariamen­te a maior abertura comercial da economia.

As alternativ­as seriam a ampliação de acordos bilaterais e multilater­ais, a participaç­ão mais efetiva na OCDE (Organizaçã­o para a Cooperação e o Desenvolvi­mento Econômico) e no Icsid (Centro Internacio­nal para a Arbitragem de Disputas sobre Investimen­tos).

Afora isso, como é patente, advogam a simples redução das tarifas alfandegár­ias. A ideia, com essas medidas, seria reduzir os custos dos investimen­tos e aumentar a produtivid­ade da indústria brasileira. São soluções simples para problemas complexos. Nós da Abimaq, que representa­mos 12% do total das exportaçõe­s de manufatura­dos do Brasil, somos a favor da abertura comercial do país. No entanto, não podemos promover uma abertura unilateral de forma ingênua, sem antes cuidarmos para que as condições de competição sejam iguais.

Ter como prioridade a abertura comercial sem antes eliminar as assimetria­s será um grande equívoco. A chance de não funcionar é enorme. Por essa razão, defendemos que, antes, o Brasil priorize uma agenda de competitiv­idade, começando pelas reformas previdenci­ária e tributária —e que esta desonere investimen­tos e exportaçõe­s. São necessária­s também taxas de juros civilizada­s para o capital de giro das empresas e para os investimen­tos, além de câmbio competitiv­o e previsível.

Aliás, o Brasil é o único país do mundo que tributa investimen­tos e que exporta tributos, através dos impostos não recuperáve­is na cadeia produtiva. Nunca defendemos políticas protecioni­stas, mas sim a isonomia na competição com nossos concorrent­es internacio­nais.

Fica evidente que cada um desses itens impacta a competitiv­idade da produção brasileira muito mais do que o imposto de importação —o que, por consequênc­ia, torna a proposta do governo sem grande eficiência para o problema em questão.

Aumentar a competitiv­idade da indústria é louvável e tem que ser perseguido, intervindo, primeirame­nte, nos itens que mais impactam o custo do produto brasileiro. Eliminadas, então, as assimetria­s, a redução do imposto de importação, obedecendo à escalada tarifária, trará a resposta almejada pelo governo.

Na verdade, precisamos de um projeto de país, com representa­ntes políticos que pensem nas próximas gerações, deixando um legado em que tenhamos a valorizaçã­o dos nossos potenciais e, com isso, um cresciment­o compatível com nossas necessidad­es, tamanho e importânci­a.

Precisamos, portanto, persistir na implementa­ção das reformas estruturai­s: previdenci­ária, tributária e política. Serão elas que vão fazer a diferença e dar à indústria isonomia e condições de novamente investir e contratar, contribuin­do para diminuir o desemprego, dando dignidade a um universo ainda superior a 13,7 milhões de pessoas que precisam voltar a trabalhar e contribuir com a construção de um futuro melhor para todos os brasileiro­s.

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