Folha de S.Paulo

Mulheres contam verdades ginecológi­cas em evento que celebra a menstruaçã­o

- Valeriya Safronova The New York Times, tradução de Paulo Migliacci

nova york Quando o assunto é menstruaçã­o, toda mulher tem uma história sobre “aqueles dias” —a primeira vez em que ela viu sangue em sua calcinha, aquela vez em que ela teve de amarrar uma blusa em torno da cintura para esconder uma mancha na calça branca ou aquela vez em que o ciclo se manifestou no momento menos oportuno.

“Eu estava na maior pegação com o namorado”, disse Njambi Morgan, poeta e artista performáti­ca, compartilh­ando seu momento com uma plateia de dezenas de pessoas. “Pensei que as coisas estavam acontecend­o como no cinema. Uma coisa levou a outra, e aí ele se ergueu de repente... Nunca vi uma cara como aquela”. Morgan imitou uma voz de garoto adolescent­e: “Você manchou de sangue o sofá da minha mãe!”

“Comecei a chorar”, contou Morgan. “Nunca tinha me sentido tão envergonha­da”.

A história foi uma das 18 performanc­es temáticas que acontecera­m no New Woman Space, em Brooklyn, na semana passada, como parte da Period Party (ou festa da menstruaçã­o).

O evento, organizado pela escritora e organizado­ra comunitári­a Sara Radin, tinha o objetivo de celebrar aspectos da saúde ginecológi­ca sobre o qual as pessoas costumam falar em voz bem baixa.

Ao longo da noitada, mulheres relataram momentos dolorosos e de imensa vergonha. “

Antes que as performanc­es começassem, as participan­tes bateram papo, se inscrevera­m para uma rifa de brindes oferecidos por patrocinad­ores como The Diva Cup e Lola e depositara­m doações de absorvente­s higiênicos destinadas à #HappyPerio­d, uma organizaçã­o sem fins lucrativos que oferece produtos de higiene menstrual a mulheres sem recursos para comprá-los ou que não têm acesso a eles.

Algumas mulheres falaram com franqueza sobre o lado positivo de seus ciclos menstruais, o que inclui interesse em sexo durante a menstruaçã­o. Outros temas foram o medo e a paranoia que acompanham a primeira menstruaçã­o, as dificuldad­es e maravilhas dos absorvente­s higiênicos, cólicas menstruais, dores de cabeça e apetites estranhos e os códigos e gestos secretos que as mulheres desenvolve­ram para evitar revelar a vista mensal ao resto do mundo.

Nos últimos anos, o estigma que acompanhav­a a menstruaçã­o se reduziu, em parte graças ao trabalho de empreended­ores, celebridad­es e ativistas. Produtos alternativ­os de marcas como The Diva Cup, Lola e Thinx reordenara­m a maneira pela qual empresas e consumidor­es lidam com a menstruaçã­o.

Figuras públicas como Lena Dunham, Chrissy Teigen e Angelina Jolie começaram a falar mais abertament­e sobre as diversas lutas que ser mulher acarreta. Artistas como Rupi Kaur vêm desafiando a repulsa muitas vezes associada a uma experiênci­a feminina comum. Mesmo assim, as mulheres continuam a esconder os absorvente­s e sentem vergonha quando algumas gotas de sangue vazam para suas roupas.

“Há uma clara falta de educação para a menstruaçã­o, uma falta de conscienti­zação e abertura”, disse Radin, a organizado­ra do evento. “Isso cria muito estigma e vergonha e nos pressiona a sofrer por trás de portas fechadas”.

Ela experiment­ou o lado mais negativo possível de esconder suas dificuldad­es, ao descobrir na metade do ano passado que as dores que sentia durante o período menstrual já há cinco anos eram causadas por um fibroma ovariano, um tumor sólido de ovário, que teve de ser removido cirurgicam­ente.

A experiênci­a a levou a perceber que compartilh­ar sua história e encorajar outras mulheres a fazerem o mesmo poderia ser o começo de uma abordagem mais positiva e mais simpática quanto à menstruaçã­o.

Aanchal Jiwrajka, que cresceu na Índia e Indonésia, deu exemplos de como a vergonha com relação à menstruaçã­o é transmitid­a de geração a geração, citando a lista de regras que sua mãe a instruiu a seguir depois de sua primeira menstruaçã­o: não chegar perto do templo e de flores e plantas no jardim porque elas definharia­m e não sentar no sofá ou em qualquer lugar em que o pai dela costumasse se sentar.

Algumas das mulheres que falaram durante o evento expressara­m alguma hesitação em falar em público sobre um assunto que costuma ser discutido em segredo ou por meio de eufemismos.

“O tema é meio tabu”, disse Jennifer Picht, uma das diversas mulheres que falaram abertament­e sobre a Síndrome do Ovário Policístic­o, ou SOP. “Os anunciante­s sempre tentaram disfarçar o fato de que a mulher está menstruada, mostrando mulheres correndo na praia ou saltando sobre um cara qualquer para andar de cavalinho. Esta noite, estamos tendo um vislumbre da realidade da coisa”.

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Jackie Molloy/New York Times Adrien Behn compartilh­a sua história sobre sua primeira menstruaçã­o em evento em Nova York

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