Agência Magnum, conhecida por fotos de tema social, mostra lado risonho
Exposição ‘Players’, com curadoria de Cristina de Middel e Martin Parr, integra festival PhotoEspaña
madri O fotógrafo alemão Thomas Dworzak quase fez um registro solene do túmulo de Robert Capa. Só que na imagem apareceu um Pokémon. Ele também quase fez um retrato singelo da fachada do Bataclan, clube parisiense onde 90 pessoas foram mortas por terroristas do Estado Islâmico. Só que na imagem apareceu um Pokémon.
As reproduções de telas do jogo de celular no qual criaturinhas japonesas são caçadas virtualmente em lugares públicos fazem parte da exposição “Players - Os Fotógrafos da Magnum Entram no Jogo”, que explora o lado divertido da lendária agência fundada por Capa e Henri Cartier-Bresson há mais de 70 anos.
Conhecida por registros de eventos históricos, como guerras, e pautas sociais, a Magnum revela agora, no Espacio Telefónica, em Madri, uma parte de seu arquivo centrada no lazer, na descontração e em cenas sarcásticas.
Junto às reproduções de telas, por exemplo, Dworzak documentou os caçadores de Pokémon. Os retratados lembram zumbis, com as cabeças sincronizadamente inclinadas para ver seus telefones.
As quase 200 fotos de 46 autores foram selecionadas por Cristina de Middel, que teve carta branca do festival PhotoEspaña para escolher artistas e curadores de cinco mostras do evento, que vai desta quarta (6) até 26 de agosto.
Ela é a segunda fotógrafa espanhola indicada para integrar a Magnum —a primeira, Cristina García Rodero, tem status de membro permanente; De Middel está em período de aprovação, e a exposição faz parte desse processo.
Ela divide a organização da mostra com o britânico Martin Parr, ex-presidente da cooperativa e conhecido por fotos sobre consumo em massa.
“Estou em fase de descobrimento”, explica a autora de fotolivros celebrados, como “The Afronauts” e “Party”.
“Descobri diversos nomes da Magnum que não conhecia; afinal são mais de 90 fotógrafos. E, desde que fui nomeada, tudo que faço tem mais transcendência, ao mesmo tempo que sinto pressão sem igual em minha carreira.”
De Middel conta que, quando sugeriu a exposição a Parr, o britânico associou a palavra “players” literalmente a esportes, embora o significado do termo seja mais amplo.
Há, é verdade, muitas cenas esportivas na mostra, como uma série de atletas em contraluz realizada pelo italiano Paolo Pellegrin ou capturas de telas de TV da Olimpíada de Munique feitas por Harry Gruyaert —o que comprova a diversidade estética da Magnum. Mas a exposição se desdobra em outros universos.
É possível encontrar fotos dos jazzistas Charles Mingus, Birdland e John Coltrane pelo francês Guy le Querrec, close-ups de membros de bandas de black metal pelo norueguês Jonas Bendiksen e cenas tomadas por Elliott Erwitt, a personificação da fotografia feita para rir —não às gargalhadas, mas com o canto de boca, diante do ridículo.
A mais clássica foto sobre diversão do acervo da Magnum, contudo, não está na mostra.
O retrato feito por CartierBresson de um menino sorridente desfilando pelas ruas de Paris com garrafas quase maiores que ele teve de ficar de fora. As condições técnicas para exibir as imagens do fundador da agência fariam com que as impressões ficassem caríssimas.
Há ainda um eixo da exposição que, de alguma forma, junta guerra e diversão.
O americano Peter van Agtmael, 37, por exemplo, exibe um registro de aparente normalidade. Um pai brinca com os filhos com sabres de luz e máscara da saga Star Wars. O homem, porém, tem uma perna mecânica, pois é veterano da Guerra no Iraque.
Já Moises Saman fotografou um apoiador de Muammar Gaddafi com um retrato do ex-ditador líbio, enquanto fogos de artifício explodem. Embora a celebração tenha sido encenada para jornalistas, a imagem parece Gaddafi fugindo de ataques —algo que viria a ocorrer.
A cena foi documentada em 2011. Desde então, a situação política mundial parece tão ou mais intensa do que na época da Primavera Árabe.
Se a polêmica em torno da eleição de Trump nos EUA, a deterioração da crise da imigração, as discussões comportamentais sobre gêneros e até a troca recente no governo espanhol parecem pautas mais urgentes, De Middel discorda.
“Relaciono-me com a realidade a partir do humor”, diz. “A realidade chegou a um ponto em que ou você faz piada ou tudo será insuportável. A ver se por meio da quebra da lógica encontramos ideias novas. Nunca vi na fotografia a função de salva-vidas. Se ela tem, não a quero mais. Que cada um encontre a linguagem que mais agrada e assim esteja tudo bem.”