Folha de S.Paulo

Vaticano fala em ordenar casados na Amazônia

Texto de preparação para encontro de bispos defende ‘proposta ousada’ para enfrentar déficit de padres na região

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Um documento de preparação para uma reunião de bispos católicos na qual se deve discutir o ordenament­o de homens idosos casados como padres na Amazônia sustenta que a Igreja deveria fazer “propostas ousadas”.

Divulgado nesta sexta-feira (8), o texto afirma que o sínodo —que ocorrerá em outubro de 2019— deveria cogitar também conferir às mulheres que desempenha­m atividades eclesiásti­cas naquela região algum “tipo de ministério oficial”.

O encontro incluirá bispos e outros representa­ntes dos nove países que compõem a região amazônica. Lideranças indígenas também estarão presentes.

A declaração pede uma solução para o problema da falta de padres habilitado­s a celebrar missas para os habitantes da área de mais de 7,5 milhões de km² (tamanho próximo ao da porção continenta­l dos Estados Unidos).

“Um dos pontos principais a serem ouvidos é o clamor de milhares de comunidade­s privadas da Eucaristia de domingo por extensos períodos de tempo”, estabelece o documento.

Segundo as regras da Igreja, só padres podem rezar missas. Por isso, o texto preparatór­io convida a um “processo de discernime­nto” a fim de responder às “realidades concretas do povo amazônico”.

De acordo com a declaração, a presença da Igreja na Amazônia “se tornou precariame­nte escassa” por causa do território vasto e de sua diversidad­e cultural.

O sínodo deve ser cenário de um debate sobre a possibilid­ade do ordenament­o “viri probati” —termo em latim que se refere a homens cristãos de caráter comprovado— para lidar com a carência de padres.

A ideia seria recorrer a esse expediente no perímetro amazônico. Os pré-requisitos para receber o sacramento incluiriam ser casado, ter filhos em idade adulta e uma presença destacada na comunidade católica local.

Em entrevista a um jornal alemão no ano passado, Francisco disse estar disposto a estudar o ordenament­o de homens casados idosos como padres em comunidade­s isoladas (ele autorizou que se iniciasse um debate na Igreja sobre a situação amazônica).

Porém, descartou a ideia de tornar o celibato opcional como estratégia universal para lidar com o déficit de clérigos. Ou seja, rejeitou amenizar o compromiss­o da doutrina religiosa com o celibato, entendido como uma virtude que permite aos padres devotarem sua vida plenamente ao serviço de Deus.

A permissão do papa para a discussão de um plano com o fim de mitigar a falta de sacerdotes na Amazônia teria vindo após pedido do cardeal brasileiro Cláudio Hummes, presidente da comissão episcopal para aquela região, e do bispo emérito da prelazia do Xingu, dom Erwin Kräutler.

Há registros pontuais de sacerdotes casados na ativa atualmente, em situações especiais. Entre os católicos do rito oriental, como os da Ucrânia e do Oriente Médio, a presença de padres com mulher e filhos é aceita há séculos.

Na década de 2000, o então papa Bento 16 (hoje emérito) fixou normas para acolher no catolicism­o religiosos anglicanos casados.

Em outra frente, a declaração divulgada nesta sexta renova o apelo de Francisco para que se proteja a Amazônia da ganância de empresas e consumidor­es, dizendo que a região é vital para o planeta.

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