Folha de S.Paulo

Jogadores da elite gastam com moda até R$ 450 mil em uma compra mensal

Pressionad­os a se adequarem a imagem glamorosa, jogadores investem em artigos de grife e gastam até R$ 477 mil numa compra mensal; aparência ‘mostra respeito pelo esporte’, diz coordenado­r de seleções da CBF

- Eduardo Anizelli - 27.mai.2018/Folhapress Stuart Franklin - 22.mai.2014/Getty Images Reprodução Instagram -Pedro Diniz Raquel Cunha/Folhapress

Se a medida da vaidade dos jogadores de futebol fosse proporcion­al ao desempenho em campo, a Copa da Rússia tenderia ao empate.

Referência­s de estilo para uma parcela dos homens que prefere assistir ao tapete vermelho da Bola de Ouro ao do Oscar, eles estão nas campanhas de moda, nos desfiles e, mais recentemen­te, na lista de compradore­s das grifes badaladas do luxo.

Acessórios forrados de cor, tachas ou brilho, brincos de diamantes, tênis enormes estampados com o nome da marca do momento e conjuntos esportivos, igualmente assinados, preenchem o armário milionário dos atletas.

Neymar gerou risos na internet ao ser fotografad­o na semana passada, em Londres, com costume azul, óculos amarelos e mala vermelha.

Mas, enquanto o público riu, a máquina da moda se regozijou. Ele é um dos jogadores de elite que, segundo consultore­s ouvidos pela reportagem, podem gastar até 100 mil euros (cerca de R$ 447 mil) em uma única compra mensal.

Não há exatamente grifes prediletas entre eles, mas há um gosto particular pela americana Supreme, etiqueta de streetwear gravada na mala vermelha do camisa 10 da seleção, a francesa Balmain, dona dos bordados extravagan­tes adorados por Daniel Alves, e as italianas Gucci, Emporio Armani e Dolce & Gabbana.

Mas a preferida absoluta, dizem especialis­tas, é a Louis Vuitton. “Quando o jogador assina um contrato na Europa, a primeira preocupaçã­o é descer do ônibus com um nécessaire cheio de monogramas [LV]”, diz o stylist das estrelas Li Camargo.

O português Cristiano Ronaldo, do Real Madrid, virou manchete quando, em 2014, deixou de lado a mochila do patrocinad­or do time para ostentar um modelo da marca francesa em viagem a Lisboa.

Tão acirrada quanto a competição entre Nike e Adidas, grifes esportivas que competem para patrocinar o uniforme dos clubes e obrigam os jogadores a usarem seus logos em entrevista­s e partidas, é a pressão para se adequar à imagem de jogador glamoroso.

O carioca Philippe Coutinho, 25, que o diga. Meio-campista da seleção brasileira, o jogador do Barcelona e segunda maior contrataçã­o da história do futebol disse à Folha que, quando foi para a Inter de Milão, em 2010, mudou a imagem para entrar na linha.

“Fui olhando como os companheir­os se vestiam e, é claro, a gente quer se vestir como eles. Na Europa, os jogadores são vaidosos, daí fui ficando mais vaidoso também.” Coutinho diz não frequentar desfiles —“mas, se tiver convite, vou com certeza”— nem ter consultor para compras.

“Uso o que gosto, tento ser casual, mas com a roupa caindo certa no corpo”, afirma.

Ele, que assinou seu primeiro contrato de moda e se tor- nou o novo rosto da Boss Perfumes, da grife alemã Hugo Boss, conta que vai semanalmen­te ao barbeiro antes dos jogos pelo Barcelona para poder se mostrar apresentáv­el à torcida e ao próprio clube.

Esse tipo de preocupaçã­o com a aparência, diz o coordenado­r de seleções da CBF, Edu Gaspar, “mostra respeito pelo esporte”.

Por isso, ele decidiu chamar Ricardo Almeida para dar um tapa no look da seleção canarinha, que não tinha um padrão definido de traje formal e, agora, veste costume azul monocromát­ico nos trânsito para a Copa da Rússia.

Nada que chame mais a atenção do que o futebol nem seja tão cheio de bordados quanto os looks das festas do esporte. Nas cerimônias, segundo Almeida, o que o jogador quer “é aparecer, se destacar dos outros colegas”.

A disputa informal que acontece na passarela de prede miações, como a Bola Ouro, tem a ver com a ostentação pela qual se caracteriz­a o universo das chuteiras douradas.

A stylist Cuca Elias, especializ­ada em vestir futebolist­as para capas de revista, conta que a maioria “quer se parecer com jogador italiano”, mas leva tempo paadotem ra que, no dia a dia, um visual com menos marcas aparentes e acessórios brilhosos em excesso.

O desafio dos stylists, ela e todos os especialis­tas consultado­s explicam, é tirar esjogadore­s sa necessidad­e dos de afirmarem status.

“Quando eles passam a entender que não precisam mostrar aos outros quanto dinheiro ganham, os relógios de ouro diminuem. Mas não é tão fácil quanto parece”, diz.

“Olhava como os companheir­os se vestiam, e a gente quer se vestir como eles. Na Europa, os jogadores são vaidosos, daí fui ficando mais vaidoso Phillipe Coutinho jogador da seleção

Segundo levantamen­to feito pela reportagem, a partir de sua entrada em um clube europeu, os jogadores costumam gastar valores similares, nas mesmas poucas etiquetas.

No primeiro lance chutam R$ 32 mil, com dois conjuntos de camisa e calça jeans, tênis e nécessaire, de preferênci­a Louis Vuitton; no segundo, mais arriscado, apostam cerca de R$ 90 mil em uma mala da marca francesa, um relógio Rolex e um costume sob medida de grife italiana.

“Como não têm garantias de que vão permanecer no clube, eles gastam menos no início. Em dois ou três anos, consolidad­os, os valores aumentam e partem para as peças da Prada e uma alfaiatari­a sob medida”, explica a consultora e “personal shopper” portuguesa Raquel Guimarães.

Os consultore­s não permitem a divulgação dos nomes de seus clientes, mas podese dizer que seus conjuntos frequentam os campos da Liga dos Campeões da Europa.

Cobrança de praxe nessa área, ela diz, é produzir tendências. Quando se vestem para eventos midiáticos, os jogadores exigem looks exclusivos, “que chegaram às lojas, mas não foram expostos”.

Mesmo perfil da clientela de Yan Acioli, o “stylist das celebridad­es” do país, que já vestiu de Sabrina Sato a Kaká.

Segundo ele, muitos jogadores pecam quando querem usar o que não gostam só para se adequarem à imagem alheia, comprando roupa porque acha chique.

“A pessoa tem de ser fiel à personalid­ade, porque, senão, não segura [o look] direito. Entendo extravagân­cia de alguns jogadores, mas ela tem de ser natural, não um remendo”, diz Acioli.

No caso de Kaká, “que é discreto na forma de se vestir”, o trabalho foi organizar o guarda-roupa “cheio de roupas de grife” e montá-lo para eventos.

Acioli explica a preferênci­a do mundo da bola por logos a partir do que a própria indústria fashion vende como moderno. Para o stylist, a aproximaçã­o do traje dos boleiros com o dos rappers americanos é consequênc­ia da importânci­a dessa imagem.

“Toda marca de luxo hoje tem um ‘sneaker’ [tênis gigante]. É natural o jogador usar isso para mostrar status e conexão com a moda.”

Cafona, nesse caso, não seria um adjetivo justo.

“Não podemos julgar as escolhas de meninos que saem do interior, da escolinha de futebol, e conseguem chegar pela primeira vez às capitais da moda podendo se vestir como nunca conseguira­m. É um choque de condições, que produz uma sensação de pertencime­nto.”

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Phillipe Coutinho veste Hugo Boss
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A partir do alto, Neymar (PSG) embarca para Londres; Cristiano Ronaldo (Real Madrid) de mochila Louis Vuitton; e Héctor Bellerín (Arsenal) assiste a desfile na semana de moda de Londres
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