Folha de S.Paulo

Nem Político nem gestor

- Nabil Bonduki Professor titular da FAU-USP, ex-vereador e relator do Plano Diretor de São Paulo. Escreve às terças

Com a dificuldad­e de Alckmin se tornar um candidato competitiv­o, João Doria ressurge oculto, como um fantasma à espera da oportunida­de de ser o candidato do “centro”.

O ex-prefeito negou a intenção de tomar o lugar do seu padrinho na sabatina da Folha/ UOL/SBT. Os paulistano­s, que o conhecem bem, sabem o valor da sua palavra.

Enquanto dizia apoiar Alckmin, correu o país, em 47 eventos de pré-campanha, para ser mais conhecido e garimpar aliados. Para obter simpatias, bajulou partidos e até Temer. Tentou ser o anti-Lula.

Em seguida, com o odor de traição, propôs que o PSDB escolhesse o mais bem situado nas pesquisas e que atraísse mais aliados. Recuou quando estacionou nas pesquisas e sua aprovação na prefeitura despencou.

Repetiu centenas de vezes e até assinou um compromiss­o de que seria prefeito por quatro anos. Renunciou ao cargo com 15 meses de gestão.

Esse histórico mostra a baixa credibilid­ade de suas declaraçõe­s. Insiste que não é político, é gestor. Mas sua passagem pela prefeitura não o credencia nem como político, com P maiúsculo, nem como gestor.

Não sabe lidar com os conflitos, comuns na administra­ção pública, que requerem capacidade de negociação. Agrediu cidadãos, jornalista­s e políticos que o questionar­am.

Reconheceu não saber lidar com as normas administra­tivas, chamada de “burocracia”. São mesmo complexas, mas um gestor precisa conhecêlas, utilizá-las e, se inadequada­s, alterá-las.

Modernizar a gestão é essencial, mas é trabalhoso, requer aptidão e tempo. Um bom gestor aproveitar­ia o cargo de prefeito para promover mudanças e se qualificar para funções complexas. Mas ele preferiu fazer política, com “p” minúsculo, e deixou problemas graves na cidade.

O contrato com a empresa que venceu a licitação para a PPP da Iluminação pública foi suspenso pela Justiça, sob suspeita de corrupção. As áreas escuras da cidade se multiplica­m.

A licitação do sistema de ônibus foi suspensa pelo TCM, após o conselheir­o Edson Simões ter identifica­do 51 irregulare­s. O sistema funciona com contratos de emergência.

O mais grave é a limpeza pública. O “gestor” não realizou licitação para um novo contrato para limpeza e varrição das ruas, que está em regime de emergência (R$ 1,2 bilhão por ano).

A Justiça exige que a prefeitura faça uma “seleção pública e isonômica” e impediu a continuida­de dos atuais contratos de emergência após esta quarta-feira (13). A cidade que já está suja, poderá ficar imunda.

Tendo deixado tantos abacaxis para seu sucessor, o político, que tenta novamente se fantasiar de gestor, lidera as pesquisas para o governo, enquanto seus olhos piscam para Brasília.

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