Folha de S.Paulo

Partidos tentam tornar mais flexível regra para vaquinhas pela internet

Para as legendas, norma da Justiça Eleitoral, que será avaliada pelo ministro Luiz Fux, dificulta a vida de doadores generosos

- Joelmir Tavares

Um eleitor querer doar dinheiro para ajudar a bancar a campanha de um candidato, mas ter de respeitar um limite de até R$ 1.064 por dia é um problema?

Para partidos que lançarão nomes para a eleição de outubro, pode ser. Siglas como PSDB, DEM e Novo estão reclamando da regra, que é estreante na legislação eleitoral e deve valer até 15 de agosto.

As três legendas questionar­am o TSE (Tribunal Superior Eleitoral). Dizem que a norma dificulta a vida de doadores generosos —alguém, por exemplo, que quiser dar R$ 50 mil terá de fazer contribuiç­ões ao longo de quase 50 dias.

O impasse é tão novo quanto o sistema. É fruto de uma inovação adotada pela primeira vez nas campanhas: a autorizaçã­o para políticos captarem, ainda na fase de pré-candidatur­a (sem o registro oficial), recursos para a campanha via crowdfundi­ng na internet.

A possibilid­ade empolgou os postulante­s, que com a proibição de doações de empresas passaram a depender mais da boa vontade de pessoas físicas.

O dinheiro arrecadado nas vaquinhas se somará aos recursos do fundo eleitoral (de origem pública) a que cada sigla tem direito.

“Uma das intenções era dar uma previsibil­idade de receita, para o candidato já começar a campanha propriamen­te dita sabendo quanto tem em caixa”, diz o deputado federal Marcus Pestana (PSDB-MG), secretário-geral do partido.

Com o limite diário —estabeleci­do pela Justiça para coi- bir fraudes e facilitar o rastreamen­to do uso de laranjas para mascarar doações irregulare­s—, o candidato pode não conseguir arrecadar o montante que gostaria nesta fase, argumenta o tucano.

“O limite diário poderia ser maior ou nem existir, já que há outra régua de controle”, diz Moisés Jardim, presidente do Novo e também articulado­r da contestaçã­o feita ao TSE.

Ele se refere ao teto de contribuiç­ão que uma pessoa pode dar para um candidato, que é de 10% dos rendimento­s brutos no ano anterior à eleição.

A captação online é permitida desde 15 de maio. Empresas cadastrada­s pelo TSE para operarem o financiame­nto devem reter os recursos e só repassá-los aos candidatos depois que eles tiverem o registro de candidatur­a, em agosto.

Com o início oficial do prazo de campanha, doações diárias acima de R$ 1.064 estarão liberadas, mas só via transferên­cia bancária —e não via cartão de crédito, meio mais usado nas vaquinhas virtuais.

Embora sejam minoria, os doadores com capacidade para contribuiç­ões gordas existem. “E muitos estão dispostos a colaborar, especialme­nte neste momento de busca por renovação política”, diz José Gustavo Fávaro Barbosa, pré-candidato a deputado federal em São Paulo pela Rede.

A média das doações para candidatos no Brasil, segundo estimativa­s de empresas do ramo, é de R$ 100. Com os sintomas de rejeição à política, há a desconfian­ça de que a ideia de pôr a mão no bolso enfrentará resistênci­as.

Porta-voz nacional da Rede até abril, Barbosa diz que o limite é um obstáculo a mais no caso de políticos como ele, que nunca tiveram mandato, tentam se descolar de partidos tradiciona­is e contam com poucos fundos públicos.

Com a campanha mais curta, de 45 dias, a expectativ­a era que a criação das vaquinhas três meses antes desse um respiro no caixa dos candidatos.

O pedido enviado por PSDB, DEM e Novo ao TSE, para que o limite de R$ 1.064 seja derrubado, está no gabinete do presidente da corte, Luiz Fux.

A tendência hoje é que a regra seja mantida. O tribunal, via assessoria, diz que não vai se pronunciar antecipada­mente sobre questões que ainda serão deliberada­s pelos ministros.

Críticos ao limite dizem que a Justiça Eleitoral dispõe de outros meios para coibir irregulari­dades. “O risco de fraude existe com ou sem limite. Não me parece que é dessa maneira que vão evitar”, diz Jardim.

A divulgação de doadores e valores tem de ser feita pelas empresas em tempo real. Além disso, as transações são cruzadas com bases de dados da Receita Federal e do Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeira­s).

“Acho legítimo discutir o valor”, afirma Marcelo Issa, do Movimento Transparên­cia Partidária.

“Mas não podemos nos esquecer de que o limite é um mecanismo para minimizar o risco de que a legislação seja burlada”, afirma.

Ele exemplific­a: achar várias pessoas para servirem de laranjas e doarem é mais difícil do que ter só uma dando uma quantia alta. “Cria um obstáculo para mal-intenciona­dos.”

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