Folha de S.Paulo

Resistir (e falhar)

- Giuliana Vallone Secretária-assistente de Redação da Folha, foi correspond­ente em Nova York

Há muitos motivos para não comemorar a chegada da Copa do Mundo de 2018. A começar pela anfitriã do Mundial, a Rússia do autoritári­o Vladimir Putin, principal beneficiár­io político de um evento bemsucedid­o, dentro e fora de seu país.

A Rússia homofóbica de Ramzan Kadirov, presidente da Tchetchêni­a, república que integra a Federação Russa e palco de diversos ataques contra a população LGBT.

Suas leis retrógrada­s proíbem manifestaç­ões públicas de afeto ou em apoio à comunidade LGBT em locais em que possa haver crianças. Em razão disso, o Itamaraty incluiu no Guia do Torcedor Brasileiro a recomendaç­ão de que casais do mesmo sexo não se beijem ou andem de mãos dadas nas ruas —sob pena de serem deportados.

Sob Putin, a Copa terá outra cara: seu governo proibiu também aglomeraçõ­es espontânea­s de torcedores durante o maior evento esportivo do planeta. Quer comemorar a vitória do seu time? Queira, por favor, dirigir-se à fan fest mais próxima. Futebol não é baderna, afinal (risos).

A escolha do país como sede, aliás, foi cercada de boas intenções. Dos 24 integrante­s do conselho executivo da Fifa em 2010, responsáve­l pela eleição da Rússia-2018 e do Qatar-2022, mais de metade se viu implicada em investigaç­ões posteriore­s de corrupção.

Os processos, de responsabi­lidade do Departamen­to de Justiça americano e que tiveram início em 2015, chegaram à CBF (Confederaç­ão Brasileira de Futebol). José Maria Marin está preso. Seu sucessor, Marco Polo Del Nero, foi banido do futebol —mas não sem antes ajudar a eleger um aliado, Rogério Caboclo.

Nem a música oficial da Copa-18 é boa. “Live it Up”, de Nicky Jam, Will Smith (?) e Era Istrefi, só me faz pensar nas saudades que sinto da Shakira e, sim, do Pitbull (e até da Claudia Leitte). Não teremos Itália, Holanda, Chile. Nem “OOO-EEE-AAA”.

Mas eis que chega o primeiro email sobre o bolão da Copa. Os amigos começam a inventar compromiss­os para assistir aos jogos. Alguém pintou a calçada da rua de verde e amarelo. O Brasil ganhou de 3 a 0 num amistoso contra a Áustria no domingo. Salah se recuperou e vai jogar pelo Egito —e derrotar a Rússia, sua adversária na primeira fase, para nossa alegria, espero.

De modo que só me resta deixar registrada­s aqui, de antemão e publicamen­te, minhas sinceras desculpas pelo meu comportame­nto até 15 de julho. Vai, Brasil!

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