Folha de S.Paulo

Paranaense troca o Brasil pela Polônia e se junta a legião de atletas naturaliza­dos

Zagueiro Thiago Cionek, do Spal (ITA), é um dos cinco jogadores nascidos no território nacional que disputarão o Mundial por outra seleção

- -Klaus Richmond

santos “Você é brasileiro?” A pergunta feita pelo goleiro Alisson, da Roma, para o zagueiro Cionek, do Spal, ao fim de uma partida pelo Campeonato Italiano em abril, foi seguida por um visível espanto no semblante do titular da seleção do técnico Tite.

Há dez anos na Europa, o paranaense, desconheci­do para os brasileiro­s, será um dos cinco nascidos no país que disputarão a Copa do Mundo da Rússia por outra seleção.

Além dele, confirmado entre os 23 convocados da Polônia, seleção liderada pelo atacante Lewandowsk­i, a lista também conta com Rodrigo Moreno e Diego Costa, da Espanha, Pepe, de Portugal, e Mario Fernandes, da Rússia.

Thiago Rangel Cionek, 32, só jogou profission­almente no Brasil por poucos meses de 2007, no início da carreira, pelo CRB-AL. Descendent­e de imigrantes poloneses, enxergou em um teste no modesto Jagielloni­a Bialystok, no ano seguinte, a chance de mudar o próprio rumo no futebol.

“Me sinto um europeu. Comecei no futebol aqui, tenho o entendimen­to das coisas daqui. Me considero um polonês nascido no Brasil”, disse o zagueiro à Folha.

A Polônia chega ao Mundial como uma das candidatas a surpresas. A ausência nas duas últimas edições da competição, em 2010 e 2014, foram superadas com uma campanha quase perfeita nas eliminatór­ias, com apenas uma derrota em dez jogos e 83% de aproveitam­ento dos pontos.

Antes disso, foi eliminada por Portugal na Eurocopa-2016, nos pênaltis, sem perder nenhum jogo. Esses resultados a fizeram saltar para o top 10 do ranking da Fifa e lhe dando a condição de cabeça de chave da competição. A Polônia está no Grupo H da primeira fase, junto a Senegal, Colômbia e Japão.

Tão surpreende­nte quanto a própria seleção foi a superação pessoal de Cionek para se tornar o que ele próprio chama de “faz-tudo” na seleção.

“Na Polônia, me chamam de um jogador para missões especiais. Sou um “Severino” mesmo, um faz-tudo. O treinador tem a confiança de contar comigo em qualquer posição. Sinceramen­te, nunca pedi para jogar em nenhuma.”

Desde a primeira convocação, em maio de 2014, o zagueiro já atuou como lateral direito, esquerdo e volante. Nos últimos amistosos preparatór­ios para a Copa, tem atuado como líbero no esquema com três zagueiros do técnico Adam Nawalka.

Ele diz que tinha tudo para ficar pelo caminho no mundo do futebol. Cresceu sonhando com uma chance nos clubes grandes do Paraná, mas nunca recebeu nenhuma. Foi levado ainda novo por empresário­s a uma frustrada passagem por um clube da terceira divisão de Portugal.

“Nunca tive chance de fazer teste em time nenhum. Jogava em uma equipe menor, se chamava Vila Hauer. Tinha o sonho de ir para a base de algum dos grandes de Curitiba, mas é difícil entrar nesse círculo, não tive oportunida­des mesmo”, disse o jogador.

A chegada à seleção polonesa demorou. Só aconteceu após um abaixo-assinado de torcedores encaminhad­o ao presidente do país. O seu processo de concessão de cidadania estava travado.

Antes disso, a adaptação à Europa também não foi fácil. No Jagielloni­a Bialystok, clube pelo qual atuou por quatro anos, tinha dificuldad­es para se acostumar à comida, à língua e ao frio de até -20°C.

Conseguiu vencer as dificuldad­es iniciais com a ajuda de outro brasileiro, o meia Hermes, já aposentado, com passagem pelo Corinthian­s.

“Ele me ajudou muito, tive essa sorte. No começo, trazia muito feijão. Eu ia almoçar sozinho e nunca sabia direito o que viria. Tentava de tudo para combater o frio, mas não conseguia”, conta.

Hoje, falando polonês fluentemen­te, Cionek finca cada vez mais suas raízes no país.

Na Eurocopa, em 2016, foi elogiado por cantar nas partidas o hino polonês. Possui ainda um relacionam­ento de oito anos com uma polonesa, com quem deve oficializa­r união após a Copa. O casamento será na Polônia.

Sua carreira foi construída longe de glamour dos grandes clubes e ligas. Uma realidade diferente do que a maioria dos atletas da seleção brasileira presenciou, mesmo aqueles menos badalados.

Em janeiro ele chegou ao Spal e ajudou o clube novato a permanecer na primeira divisão do Italiano. Façanha, por sinal, que já havia feito quando atuou pelo Palermo. Antes, passou por outros clubes pequenos clubes do país, como o Padova e o Modena.

Antes de acertar a ida para o Spal, o jogador foi especulado pelo Atlético-PR. Cada dia mais adaptado ao país que o acolheu, não faz planos: “Conversei com o Atlético-PR e ficaria honrado em jogar lá, mas não pretendo voltar”.

Ao lado de Lewandowsk­i, o brasileiro espera conduzir a Polônia a novos feitos, mesmo que precise passar pelo Brasil para isso. “Se acontecer, não há divisão. Vou fazer de tudo pela Polônia.”

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Thiago Cionek, 32 Descendent­e de poloneses, nasceu em Curitiba, em 21.abr.1986. Sem conseguir chances nos clubes do estado, resolveu se aventurar no futebol polonês depois de rápida passagem pelo CRBAL. Após quatro anos no Jagielloni­a Bialystok, foi...

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