Direitista tem favoritismo na eleição de hoje na Colômbia
Afilhado do ex-presidente Álvaro Uribe, Iván Duque vê vantagem para o esquerdista Gustavo Petro diminuir na reta final
Iván Duque, 41, que defende endurecer com a Venezuela, é favorito no segundo turno do pleito que elegerá o primeiro presidente da Colômbia após o acordo de paz com as Farc, informa Sylvia Colombo.
Seu rival é o esquerdista Gustavo Petro, 58, que propõe diálogo com Caracas.
O novo presidente encontrará uma economia em recuperação.
bogotá Embora algumas pesquisas tenham mostrado nas últimas semanas um aumento das intenções de voto no candidato esquerdista Gustavo Petro, 58, é o direitista Iván Duque, 41, que chega a este domingo (17), dia do segundo turno da eleição presidencial na Colômbia, como franco favorito.
Trata-se da primeira votação para escolher o mandatário do país após o acordo de paz com as Farc (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia), num país ainda conflituoso no interior, mas cuja taxa de homicídios em 2017 foi a mais baixa desde 1975, segundo o presidente Juan Manuel Santos.
Também é a primeira vez desde 2002 que os protagonistas não serão o ex-presidente Álvaro Uribe, padrinho de Duque, ou Santos, rostos mais conhecidos da polarização dos últimos 16 anos. Trata-se de uma mudança de geração.
O novo presidente encontrará um país com uma economia em recuperação (projeção de crescimento de 3% para 2018) e um projeto de paz que precisa terminar de ser implementado para potencializar a contribuição da área rural e do turismo para o PIB —além de forte apoio no exterior.
Além do Prêmio Nobel da Paz obtido por Santos, a Colômbia ainda passou a integrar a OCDE (Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico) e a Otan (Organização do Tratado do Atlântico Norte), ligas das quais nem Brasil nem Argentina são membros.
Entre os desafios do novo mandatário estão diminuir a desigualdade —segundo o Banco Mundial, a Colômbia é o 2º país com sociedade mais díspar na América Latina; o Haiti lidera o ranking—, reduzir a pobreza extrema e realocar os deslocados por mais de 50 anos de violência.
Nas últimas semanas, Petro, que teve 4,8 milhões de votos no primeiro turno (25% do total), recebeu o endosso de parte do eleitorado de Sergio Fajardo (centro-esquerda), que ficou em terceiro lugar, com 4,6 milhões de votos (24%).
Apesar de seu líder ter anunciado que votaria em branco, muitos ex-fajardistas se somaram à candidatura de Petro.
Outro espaço em que o esquerdista avançou foi entre os ex-eleitores do Partido Liberal, que teve votação pífia e costumava reinar no Caribe. Petro centrou aí seus esforços e fez subir seus números.
Dito isso, as pesquisas (que erram muito na Colômbia) dão ainda um amplo favoritismo a Duque. Porém, se na primeira semana pós-primeiro turno a diferença entre os candidatos era de até 20 pontos, agora baixou para em alguns casos 4, segundo medições internas dos partidos.
Pelo fato de as opções terem ficado entre dois extremos, é possível que o comparecimento às urnas diminua —foi de 52% no primeiro turno, um recorde para padrões da Colômbia, onde costumam votar entre 40% e 45% dos eleitores. Se a abstenção for alta, segundo analistas, Duque sairá ganhando.
A campanha do segundo turno foi atípica, se comparada às de outros países da região. Quase não houve ataques de baixo nível de um lado a outro. Tampouco houve debates, como no primeiro turno, e os candidatos preferiram viajar para fazer campanha.
Além disso, diferentemente do que muitos pensam fora da Colômbia, incluindo os meios de comunicação estrangeiros, o cerne desta eleição não foi a questão da paz.
Os dois candidatos enfatizaram a criação de empregos formais como prioridade. Duque defendeu mais abertura para investimentos, tratados internacionais e estímulo ao empreendedorismo, enquanto Petro dedicou-se a prometer proteção para os mais pobres e estímulo para a reativação da zona rural.
Ambos concordam que o campo é um perímetro que pode gerar riqueza no pósguerra, por meio da agricultura e do turismo por regiões antes ocupadas pela guerrilha.
Duque expressou preocupação com alguns itens do acordo de paz com as Farc, sobretudo em relação à eleição de pessoas com condenações prévias e à anistia a narcotraficantes. Já Petro vestiu a camisa da continuidade da implementação do pacto tal qual foi aprovado em 2016.
Os dois jogam, porém, com medos do eleitorado. Os apoiadores de Duque temem as relações próximas que Petro teve, até outro dia, com o chavismo —ainda que, recentemente, o ex-guerrilheiro do M-19 tenha se posicionado contra o regime venezuelano e chamado Nicolás Maduro de ditador.
Já os apoiadores de Petro receiam a volta do uribismo ao poder, com seus métodos nem sempre institucionais, como financiar paramilitares para combater o crime organizado e favorecer amigos. Segundo pesquisa recente, o índice de rejeição de Petro é de 38%, e o de Duque, de 26%.
Curiosamente, o termo ajuste, tão conhecido no discurso político na Argentina e no Brasil ultimamente, não foi mencionado por nenhum dos dois.
Duque fala em diminuir impostos para os mais pobres, mas não deixa claro de onde viriam os recursos para as reformas que anunciou. Já Petro é mais claro, defendendo a taxação das grandes fortunas. O ex-prefeito de Bogotá recebeu, nos últimos dias, o apoio do economista francês Thomas Piketty, autor de “O Capital no Século 21”. A partir de sua conta nas redes sociais, ele influenciou debates domésticos, propagandeou candidatos em eleições regionais e fez campanha pelo “não” no plebiscito da paz que saiu vitoriosa.
Nas eleições legislativas, em março, foi reeleito senador com o maior número de votos da história da Colômbia, o que fará dele líder da Casa.
E o principal objetivo terá sido atingido. Fez com que o menos opaco entre os mais fiéis uribistas, Duque, conhecido por só 25% dos colombianos um ano atrás, chegasse na reta final como favorito à Presidência.
Uribe teve dois mandatos na Presidência porque alterou a Constituição. Tentou um terceiro, mas a Justiça o impediu. Santos, no segundo mandato, voltou a eliminar a reeleição.
O ex-presidente conseguiu também coisas pouco plausíveis, como convencer boa parte da população de que Santos, seu ex-afilhado e seu exministro da Defesa, era um esquerdista radical.
Além disso, logrou escapar, por ora, das mais de 200 acusações que existem contra ele na Justiça e que incluem crimes de corrupção, escutas ilegais de opositores, uso de hackers em campanhas eleitorais, supostos vínculos com o narcotráfico e os chamados falsos positivos —assim chamados devido às metas mensais de mortes de guerrilheiros que Uribe impunha aos paramilitares.
Quando não conseguiam, os “paras” matavam civis mesmo, e afirmavam ser guerrilheiros.
A Justiça, depois de um longo trabalho de investigação, concluiu que muitos deles não tinham vínculos com as guerrilhas, por isso foram chamados de falsos positivos.
Os mandatos de Uribe lhe conferem foro privilegiado, e as reiteradas tentativas da oposição de derrubar esse privilégio e de dar prosseguimento aos julgamentos até agora não vingaram.
Mais de uma vez, também, Uribe demonstrou a Santos ter informações secretas das altas cúpulas do Exército, e com isso conseguiu pressionar o atual presidente.
Entre seus apoiadores, é tido como uma figura que trouxe segurança às cidades, pois as manteve policiadas de modo ostensivo. Além disso, conteve a violência no campo ao financiar as milícias paramilitares.
Por essa via nada institucional, conseguiu que as Farc diminuíssem muito em números de combatentes. O que, ironicamente, ajudou Santos, já na Presidência, a convencer os guerrilheiros restantes a se sentar para negociar o acordo de paz em 2012 —aprovado pelo Congresso, à revelia de Uribe, em 2016.