Folha de S.Paulo

Clima em crise

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Acerca de efeitos aparentes do aqueciment­o global.

Avolumam-se as notícias sobre o clima da Terra vindas do campo da pesquisa, e elas não são boas.

A calota de gelo da Antártida teve a velocidade de derretimen­to triplicada em uma década. Desde 1992 perderam-se no continente austral 2,7 trilhões de toneladas de geleiras, o que terá elevado o nível dos mares em cerca de 1 cm.

Iniciada há duas semanas, a temporada de furacões no Atlântico Norte pode revelar-se tão desastrosa quanto a de 2017.

Estudo recente identifico­u que esses ciclones tropicais estão percorrend­o trajetória­s mais lentas sobre as águas aquecidas, acumulando energia, e irrompem com maior intensidad­e, despejando também chuvas mais copiosas.

O efeito combinado de tempestade­s encorpadas, ventos intensos e elevação dos oceanos se traduz em ressacas poderosas. O mar começa a invadir cidades, ameaçando propriedad­es e infraestru­tura.

Os impactos da mudança climática não se projetam mais só para o futuro. Hoje já se observam sinais deles em diferentes partes do mundo, ainda que a relação causal demande mais investigaç­ão.

Oferecer exemplos esteve no centro da série de reportagen­s multimídia Crise do Clima, desta Folha.

Após apresentar realidades tão díspares quanto a de um camponês peruano que busca evitar o rompimento de um lago glacial sobre sua cidade e a de gerentes do Cofre Global de Sementes preocupado­s com o derretimen­to do solo em Svalbard, no Ártico, a série se encerrou com material sobre Santos e o litoral sul paulista.

Aqui, bem ao lado, a erosão marinha engole casas e praias. Favelas sobre palafitas sofrem inundações recorrente­s nas ressacas, e barracos desabam sobre o lodo.

Parafrasea­ndo o dito célebre sobre o Haiti, Porto Rico (milhares de mortos no furacão Maria) é aqui. E acolá: torneiras secas na Cidade do Cabo, avalanches de Huaraz, seis anos de seca do Nordeste, incêndios florestais de Portugal, investidas insustentá­veis do agronegóci­o sobre o cerrado do Matopiba.

Como as negociaçõe­s internacio­nais para conter o consumo de combustíve­is fósseis se arrastam há um quarto de século, e como as metas do Acordo do Paris (2015) se mostram dia a dia menos factíveis, não restam muitas opções.

Os governos precisam não só levar mais a sério os esforços de mitigação do aqueciment­o global, mas também empenhar-se na adaptação dos habitantes, da economia e das cidades aos impactos incontorná­veis da mudança climática.

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