Folha de S.Paulo

Piora a conversa

Ajuste fiscal que não quer aumentar receita e não quer cortar despesa é enganar o eleitor

- Samuel Pessôa Físico, doutor em economia, pesquisado­r do Ibre-FGV e sócio da consultori­a Reliance

Na quinta da semana passada (14), o jornal Valor Econômico publicou entrevista de André Lara Resende e Eduardo Giannetti da Fonseca, assessores econômicos da candidatur­a de Marina Silva à Presidênci­a.

O tom da entrevista foi ruim. Não há por parte deles noção da gravidade do problema fiscal e falta sentido de urgência.

A emenda do teto já é um ajuste fiscal muito gradual. Com ela, teremos déficit primário de 2014 a 2020, pelo menos. O cenário mais otimista é que o resultado primário positivo volte entre 2021/2022, mas em um nível que não estabiliza­rá a relação dívida/PIB.

Sem a emenda do teto dos gastos ou com um teto mais brando, parte do ajuste terá de vir de uma maior carga tributária.

Ser contra a emenda do teto e o aumento da carga tributária, e a favor de um ajuste fiscal supergradu­al, é algo difícil de entender. Se o teto já significa um ajuste gradual, o que seria mais gradual ainda? Esperar a dívida pública chegar a 100% do PIB?

Talvez maior gradualism­o fosse possível com forte reestrutur­ação da dívida da União por meio de um rápido processo de privatizaç­ão. Mas um processo de privatizaç­ão veloz, mesmo em um governo forte, leva em média dois anos.

Há diversas formas de fazer ajuste fiscal: ou aumento de receita e/ou corte de despesa. Ajuste fiscal que não aumenta a receita e não corta a despesa é enganar o eleitor. A despesa primária do governo central neste ano será de R$ 1,375 trilhão. A despesa discricion­ária total é de R$ 125 bilhões, mas a despesa realmente discricion­ária, que exclui gastos de outros Poderes e gastos obrigatóri­os definidos pela LDO, é de R$ 80 bilhões.

Construir base partidária de apoio no Congresso para aprovar projetos em um Congresso com mais de 28 partidos políticos requer atender políticas das diversas legendas. Isso significa execução de políticas públicas a partir da demanda dos partidos da base. Algo normal em qualquer democracia. O Congresso não vota baseado nos belos olhos do presidente.

O maior incentivo à votação da reforma da Previdênci­a não está ligado ao envelhecim­ento da população brasileira. O maior incentivo é que a despesa da Previdênci­a está “expulsando” —isto é, tornando cada vez mais inviáveis— as demais despesas. Para um gasto programado neste ano de R$ 1,375 trilhão, todo o debate orçamentár­io está em um subgrupo de R$ 80 bilhões.

Falar que “não é fiscalista”, que é contra o teto e que não quer aumento de imposto não promove o bom debate político de que necessitam­os. É necessário um posicionam­ento mais claro ou estaremos alimentand­o a ideia de que é possível fazer ajuste fiscal apenas com combate à corrupção. coluna de 7 de junho nesta Folha, repercutiu post de Bráulio Borges no Blog do Ibre. Bráulio argumenta que os subsídios do BNDES elevaram a oferta de fretes. Todo o problema do setor é fruto da queda da demanda por fretes.

Se a tese de Bráulio está correta, há duas consequênc­ias.

A primeira é que a demanda por aquisição de caminhões é insensível a preços. Seria legal Bráulio documentar esse fato pouco usual.

A segunda, que a inutilidad­e do BNDES é ainda maior do que diversos estudos têm apontado. Subsídio não consegue nem elevar a demanda por caminhões!

Ou seja, a quantidade de dinheiro do contribuin­te que foi jogada no lixo quando o governo petista decidiu direcionar R$ 400 bilhões ao banco é ainda maior do que eu imaginava.

Ainda o tema dos caminhões. Laura Carvalho, na sua

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