Folha de S.Paulo

Análise Cláudia Collucci

- Cláudia Collucci

Avanço de informação falsa e dificuldad­e de acesso a posto ajudam a explicar índices

são paulo Há muitas hipóteses para explicar a queda histórica nos índices de coberturas vacinais de crianças, entre elas a influência dos movimentos contrários à imunização e o avanço de informaçõe­s falsas nas redes sociais.

Embora se questione o real impacto desses movimentos, uma vez que eles se concentram em nichos muitos específico­s da população, não se pode negar o estrago feito pela disseminaç­ão de “fake news” nesse campo da saúde.

No mês passado, a epidemiolo­gista Laurence Cibrelus, da OMS (Organizaçã­o Mundial da Saúde), disse que os boatos tiveram influência na baixa cobertura vacinal contra a febre amarela no Brasil.

O ideal seria que cerca de 80% da população estivesse vacinada. O número, porém, está em torno de 55%.

Isso não elimina a importânci­a de outros fatores apontados pelos especialis­tas para explicar a baixa adesão à imunização de crianças, como a dificuldad­e das famílias em acessar os postos de saúde, descaso em relação ao risco de velhas doenças e a falsa sensação de segurança.

A questão é o que fazer diante dessa situação que tem levado ao ressurgime­nto de doenças até então sob controle ou já erradicada­s. Lembrando que o Brasil conta com o maior programa público de vacinação do mundo.

No ano passado, depois de um surto de sarampo na Europa, a Itália aprovou uma lei que exige a carteira de vacinação em dia para matrícula de crianças de até seis anos em escolas.

O governo alemão passou a exigir que unidades de pré-escola informem às autoridade­s quando houver crianças não imunizadas ou cujos pais não conseguire­m comprovar a vacinação em dia. Existe multa para os responsáve­is.

Já países como Portugal e os Estados Unidos vêm tomando uma série de medidas para punir pais que não levam seus filhos aos locais definidos para a aplicação das doses.

No Brasil, escolas públicas e privadas podem pedir a caderneta de vacinação das crianças no ato da matrícula para alunos até o quinto ano do ensino fundamenta­l, mas nem todas exigem a atualizaçã­o das doses recebidas.

O ECA (Estatuto da Criança e do Adolescent­e), criado há 28 anos, e outros dispositiv­os legais garantem o direito das crianças à saúde e tornam obrigatóri­a a vacinação.

Assim, não imunizar os filhos é uma prática ilegal no Brasil, o que poderia levar os pais a responder criminalme­nte por expor suas crianças ao risco de adoeciment­o e morte, e a sociedade à disseminaç­ão de doenças passíveis de prevenção.

Mas como isso tudo não tem surtido efeito, há quem defenda a necessidad­e de se ouvir o que as famílias têm a dizer e partir para o convencime­nto, sem imposição de cima para baixo. Isso envolveria novas formas de produzir e divulgar informaçõe­s sobre saúde.

Caberia aos governos, portanto, não só ampliar o acesso, com mais postos de vacinação e horários mais flexíveis, além de adotar uma comunicaçã­o pública mais eficiente.

A mensagem às famílias deveria ser direta: você faria algo que pudesse fazer adoecer ou matar seus filhos? Por que então deixa de vaciná-los?

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