EUA não são campo de refugiados, diz Trump
Sob críticas de opositores, aliados e da mulher, americano usa segurança para justificar política de separação familiar
washington Diante do recorde de refugiados no mundo, o presidente dos EUA, Donald Trump, lançou mão do medo nesta segunda (18) para defender sua política migratória de uma chuva de críticas à separação de famílias migrantes na fronteira americana.
“Os EUA não serão um acampamento de migrantes nem uma instalação de abrigo de refugiados. Não sob o meu comando”, declarou.
Trump citou “o que está acontecendo na Europa” para alegar que “não pode permitir que isso aconteça” nos EUA e declarou que parte dos imigrantes que chegam ilegalmente ao país traz “morte e destruição”. “Essas pessoas que se esgueiram pela fronteira [...] podem ser assassinos, ladrões e tantas coisas mais. Queremos um país seguro.”
Desde que assumiu, em janeiro de 2017, Trump endureceu a política de imigração e vem restringindo a entrada de estrangeiros nos EUA, tanto na fronteira com o México quanto por meio de exigências para vistos.
Apesar disso, o número de apreensões e prisões na fronteira cresceu, movido sobretudo por imigrantes de países da América Central que fogem da crise de violência na Guatemala e em Honduras.
O número levou o governo Trump a aplicar uma política de tolerância zero à travessia, provocando a separação de centenas de famílias.
Agora, adultos que cruzam a fronteira com seus filhos são processados criminalmente por travessia ilegal e levados a presídios federais. As crianças, que por lei não podem permanecer nesses estabelecimentos, são enviadas a abrigos mantidos pelo governo.
Em seis semanas, quase 2.000 menores foram separados das famílias.
Imagens de abrigos lotados e de crianças chorando ao serem separadas dos pais começaram a surgir. “Mami! Papá!”, pedem algumas delas, aos prantos, em um áudio revelado pelo site ProPublica nesta segunda.
Diante do choro simultâneo de diversas crianças, um agente da patrulha da fronteira comenta: “Temos uma orquestra aqui. Só falta o maestro”.
A prática atrai críticas da ONU, de aliados de Trump, da ex-primeira-dama republicana Laura Bush (em artigo no Washington Post) e da atual —sua mulher, a discreta Melania, que disse detestar ver crianças separadas da família e esperar que o país promova uma reforma que permita “cumprir a lei, mas também governar com o coração”.
“É um abuso inconcebível”, disse o diretor do conselho de direitos humanos da ONU, Zeid Ra’ad al-Hussein.
Trump voltou a lamentar nesta segunda a separação das crianças de seus pais, mas atribuiu a responsabilidade à oposição democrata, que criou leis facilitando a permanência de filhos de indocumentados, o que serviria de estímulo aos pais para trazê-los.
Trump pleiteia alterações na lei migratória que incluam verba para ampliar um muro na fronteira com o México e tem usado a crise para pressionar o Congresso.
Nesta terça (19), ele deve tratar do tema com legisladores, muitos dos quais críticos às mais recentes medidas.
“É traumático para as crianças, vítimas inocentes”, disse a senadora Susan Collins, correligionária de Trump, que pediu explicações ao Executivo. que custará vidas”, afirma o etíope Tsehaye Teferra, presidente de uma organização que trabalha com o reassentamento nos EUA.
Refugiados da guerra na Síria, por exemplo, são recebidos em números restritos: 33 em outubro e dois no mês passado. Mianmar, onde a minoria muçulmana rohingya é alvo de limpeza étnica, segundo a ONU, tem cerca de 300 pedidos aprovados por mês, um terço do que tinha antes de Trump assumir e de a crise no país de origem se agravar.
O número de pedidos por abrigo, nesse período, aumentou 10%. Mas boa parte deles permanece na fila: 138 mil refugiados aguardam resposta.
É esse tempo de espera que o governo Trump usa para dosar as entradas. As médias de recusas e de aceitações continuam as mesmas, mas a máquina administrativa desacelerou, aumentando exigências para entrar nos EUA e diminuindo o número de funcionários que avaliam os casos.
“Isso equivale a fechar a porta para refugiados”, diz Mark Hetfield, presidente da Hebrew Immigrant Aid Society, que atua no reassentamento.
Em outubro, o governo reforçou exigências para os candidatos, aumentando a coleta de dados pessoais, checagens de redes sociais e antecedentes criminais.
“É um excesso de lentidão e de burocracia”, diz à Folha Eskinder Negash, presidente do Comitê para Refugiados e Reassentamento dos EUA.
A organização costumava receber 12 mil pessoas por ano. Hoje, são 3.000. Donativos se acumulam, e voluntários se inscrevem em números recordes sem serviço a fazer.
Em nota, o Departamento de Estado diz que “o reassentamento resolve apenas uma pequena parcela dos refugiados do mundo” e ressalta que Washington investe em outras formas de ajuda, como repasses para construir abrigos, fornecer refeições e prestar assistência à saúde pelo mundo.
“Continuaremos a ajudar os mais vulneráveis de forma coerente com a generosidade do povo americano”, diz o texto.