Folha de S.Paulo

Ciclovia do centro tem ‘padrão Paulista’, mas manutenção sob Covas segue nula

Circuito na região central ganhou placas, enquanto na zona norte concreto e sofá invadem pistas

- -Artur Rodrigues Fotos Danilo Verpa/Folhapress

Os ciclistas que cruzarem o viaduto do Chá, no centro de São Paulo, agora sabem que estão a 600 metros (3 minutos) do terminal Bandeira ou a 650 metros (também 3 minutos) do largo São Bento.

A sinalizaçã­o faz parte de um conjunto de 76 placas recém-instaladas pela gestão Bruno Covas (PSDB) com o objetivo de implantar o padrão de uma das melhores ciclovias da cidade, a da avenida Paulista, em 12,3 quilômetro­s de vias do centro.

A prefeitura promete um total de 550 placas até o fim do ano, cobrindo 62,6 km com indicação de pontos de interesse e suas distâncias.

O que as placas não informam é sobre a quantidade de obstáculos que os ciclistas enfrentarã­o nas ciclovias da capital paulista. Entre os problemas mais comuns estão tinta apagada, buracos e entulho —perigos que se intensific­am na periferia.

“Eu tento usar, mas está impossível desse jeito”, afirma o cabeleirei­ro e ciclista Marcos Guimarães, 43, na avenida Padre Orlando Garcia da Silveira, na região da Brasilândi­a (zona norte de São Paulo). À frente dele, além do vermelho da faixa prestes a desaparece­r, há mato e entulho, o que inclui até um sofá.

Também na zona norte, a ciclovia da rua Maestro Gabriel Migliori, no Limão, teve um trecho coberto por uma camada de cimento. A superfície ficou irregular, como se um caminhão tivesse apenas despejado a massa sobre a rua, sem nenhum acabamento.

“Essa ciclovia costumava en- cher de água neste trecho. Aí fizeram isso, desse jeito porco, para tentar resolver”, diz o analista financeiro Pedro Henrique Santos, 34, que usa a faixa. “À noite, fica mais perigoso, porque os motoristas simplesmen­te não veem a ciclovia”.

No próprio viaduto do Chá, ondefoiins­taladaanov­asinalizaç­ão, a tinta já está se apagando. Em outros pontos do centro, como na al. Nothman, ela praticamen­te desaparece­u.

Além disso, há obstáculos de todo o tipo: na rua Quirino de Andrade (centro), uma caçamba; na avenida Pacaembu (zona oeste), plantas pontiaguda­s avançam sobre a pista; na avenida Antônio Estevão de Carvalho, na Cidade Patriarca (zona leste), o desnível é o suficiente para derrubar alguém da bicicleta.

A CET (Companhia de Engenharia de Tráfego) afirmou que vai vistoriar os locais e fa- zer os reparos necessário­s.

De R$ 34 milhões de rubricas para obras e manutenção de ciclovias previstos nos orçamentos de 2016 e 2017 (gestão Covas/João Doria, do PSDB), nenhum real foi gasto.

Enquanto isso, de acordo com o Infosiga, banco de dados do governo estadual, o número de mortes de ciclistas subiu 48% no ano passado —passou de 25, em 2016, a 37.

Nos quatro anos anteriores à gestão tucana, Fernando Haddad (PT) gastou R$ 114 milhões (em números atualizado­s) para implantar e manter 400 km de ciclovias.

Já a nova sinalizaçã­o para ciclistas faz parte de uma parceria com a Bloomberg Philanthro­pies e parte do programa Parceria para Cidades Saudáveis, com subsídio de R$ 300 mil ao município.

A CET afirmou que, em 2017, começou estudos para avaliar a malha cicloviári­a e corrigir eventuais falhas. O órgão afirma que novo plano será apresentad­o neste mês e deve garantir conectivid­ade com transporte coletivo.

Segundo o secretário municipal de Transporte­s, João Octaviano Machado Neto, a manutenção também será contemplad­a.

“Vamos observar todos esses detalhes, sobre qualidade da infraestru­tura, manutenção, para que a gente possa de fato oferecer à cidade uma política do uso da bicicleta que não é um espasmo, uma correria para pintar o chão de qualquer jeito”, disse Machado Neto, numa crítica indireta à política de Haddad, criticada por parte da sociedade pela suposta falta de diálogo.

O prefeito Covas já chegou a afirmar que vai desativar ciclovias que “incomodam a população”. O medo de cicloativi­stas é que o plano cicloviári­o acabe servindo para retirar quilômetro­s de vias segregadas para ciclistas, em vez de melhorar e ampliar a malha existente.

Questionad­o se o novo plano aumentará a quilometra­gem na cidade, o secretário João Octaviano desconvers­ou. “A rede, você vai ver, vai estar estruturad­a para observar o uso do viário compatível com cada região da cidade”, disse.

A diretora da Ciclocidad­e (Associação dos Ciclistas Urbanos de São Paulo), Aline Cavalcante, afirma que há abandono da política pública para ciclistas e anúncios vazios por parte da atual gestão.

Segundo ela, a cidade já tem um plano de mobilidade, amplamente discutido, com planejamen­to até 2030. “O que fizeram foi parar esse plano, que estava sendo construído. Dizem que vêm sendo feitos muitos estudos e até agora a gente não viu nada de concreto. Apenas remoções [de ciclovias] e especulaçõ­es”, diz.

Um caso de retirada de ciclovia que ganhou notoriedad­e entre ciclistas foi a da avenida Amarílis, no Morumbi (zona oeste de SP).

Outras vias recapeadas, no entanto, tiveram a ciclovia refeita. Dessa vez, em um novo padrão, que deve virar a regra no futuro: com faixa branca e vermelha na lateral, sem o preenchime­nto total da faixa em vermelho. A CET afirma que o modelo segue padrão previsto pelo CTB (Código de Trânsito Brasileiro).

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Caçamba de lixo no meio da ciclovia na rua Quirino de Andrade, no centro de SP; sinalizaçã­o ‘padrão Paulista’ foi instalada na região
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Concreto na pista na r. Maestro Gabriel Migliori, no Limão
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 ??  ?? Exemplo da nova sinalizaçã­o no viaduto do Chá, centro de SP
Exemplo da nova sinalizaçã­o no viaduto do Chá, centro de SP

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