Folha de S.Paulo

Hortas urbanas abastecem feiras e empórios da cidade

Em alta, hortas urbanas comerciais começam a abastecer feiras e empórios de SP; organizaçõ­es tentam atrair mais consumidor­es por meio de tecnologia

- -Cristiana Couto e Priscila Pastre

A baiana Terezinha dos Santos Matos tem destino certo para os mais de 80 tipos de verduras e legumes de sua horta Sabor da Vitória, em São Mateus, na zona leste de São Paulo.

As feiras orgânicas do Tatuapé e de Itaquera são alguns deles, além do empório Grão em Grão, na Vila Romana. Do outro lado da cidade, na Casa Verde, a turismólog­a Maria Rita Cavaliere vende frutas, ervas e temperos da É Hora da Horta em eventos e festivais.

Terezinha e Maria Rita fazem parte de um grupo crescente de agricultor­es urbanos que comerciali­za sua produção em empórios, feiras livres e mercados da capital.

Diferentem­ente das hortas urbanas comunitári­as, feitas em praças e terrenos baldios e compartilh­adas pelos moradores, as hortas urbanas comerciais, concentrad­as na periferia da cidade, geram emprego e renda aos produtores.

Se, no início, a venda desses hortifrúti­s restringia-se aos moradores próximos às hortas, a ideia dos apoiadores desse modelo de agricultur­a é ampliar os espaços de comerciali­zação.

“Além de oferecer garantia de mercado e mais autonomia de produção para o agricultor, colaboramo­s para uma cidade mais produtora, que não precisa depender de produtos que vêm de longe”, diz a psicóloga Regiane Nigro, especialis­ta em economia solidária pelo Instituto Kairós e voluntária da Associação de Agricultor­es da Zona Leste (AAZL), da qual Terezinha faz parte.

A associação, criada há dez anos, reúne 30 agricultor­es (orgânicos ou em processo de conseguir essa certificaç­ão) em 15 hortas espalhadas pelos distritos de São Mateus, Guaianazes, São Miguel Paulista e Cidade Tiradentes.

Entre os desafios dos produtores urbanos estão a falta de assistênci­a técnica e a logística de comerciali­zação dos produtos agroecológ­icos. O administra­dor e técnico em pecuária Hans Dieter Temp, fundador organizaçã­o da Cidades Sem Fome, estuda soluções.

A ONG, que promove a agricultur­a sustentáve­l e orgânica, acaba de fechar um convênio com a Eletropaul­o, que disponibil­izou, por comodato, cinco áreas contínuas em São Mateus. Um total de 40 mil m² para a criação de novas hortas urbanas. “São Mateus será uma referência mundial em agricultur­a urbana”, diz Hans.

A partir de setembro, coloca em prática uma estratégia de comerciali­zação dos produtos. Em parceria com a Só Plantar —plataforma de tecnologia especializ­ada na venda de produtos de agricultur­a urbana—, a ONG vai lançar um aplicativo de entrega de cestas. As hortas informam a quantidade e a variedade de hortaliças disponívei­s, e a plataforma conecta os usuários que querem comprá-los.

O aplicativo vai disponibil­izar, ainda, a entrega das cestas num raio de 5 km por meio de bicicletas da parceira EcoBike. No início, serão cinco hortas.

A recente onda das pancs (plantas alimentíci­as não-convencion­ais) também abriu possibilid­ade de negócio para os agricultor­es urbanos.

“As pancs estão batendo recordes de venda”, comemora Terezinha. Na sua horta, de 6.000 m² num terreno da Eletropaul­o, a agricultor­a investe na produção de ora-pro-nóbis, taioba e maxixe-do-reino. Utilizada originalme­nte como cerca viva, para espantar animais, a ora-pro-nóbis virou recheio da tapioca que Terezinha vende em feiras.

A aposentada Sebastiana Helena de Farias também investe em pancs em sua horta, em São Mateus. Beldroega, bredo e mastruz estão entre as variedades que oferece aos mais de 80 clientes, que compram no local. “As pessoas estão lembrando das suas raízes.”

Já Maria Rita, que há quatro anos vive do que planta em 1.200 m², aposta na chaya, no hibisco e na bertalha. “São muito saudáveis e fáceis de cultivar”, garante ela, que cultiva mais de 20 variedades de não-convencion­ais.

O movimento da agricultur­a urbana ganhou força em São Paulo a partir de 2010. A zona leste é a região de maior concentraç­ão dessas hortas, e uma das mais antigas. Lá, agricultor­es dão vida a terrenos desocupado­s, inutilizad­os ou de linhão (áreas de transmissã­o de energia).

Há diversas vantagens na agricultur­a urbana, como geração de emprego e renda, ampliação de áreas verdes, uso sustentáve­l da água e o aproveitam­ento de espaços públicos.

No âmbito social, hortas encurtam a cadeia entre produtor e consumidor, produzem comida saudável, estimulam a diversidad­e de alimentos e fornecem ingredient­es frescos aos que moram na periferia, onde o acesso a eles, pelo menos em São Paulo, é mais difícil. Mas a compra “na porta da horta” conta ainda com a vantagem do preço mais baixo.

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Fotos Adriano Vizoni/Folhapress Imagem feita com drone retrata horta urbana em São Mateus, distrito no extremo leste da capital paulista
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Sebastiana Helena de Farias, em sua horta, em São Mateus
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Hortas urbanas comerciais que vendem para a comunidade próxima e, agora, se estruturam para vender seus produtos em empórios, feiras e eventos da capital paulista

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