Na Sérvia, geopolítica e futebol se misturam na torcida e no campo
Adversário do Brasil é centro de polêmica com manifestação da torcida e provocação de atletas suíços de origem kosovar
Futebol e política sempre se misturam. É assim na Sérvia, rival do Brasil nesta quarta-feira (27), às 15h, pela última rodada do Grupo E da Copa do Mundo.
Neste Mundial, os dois jogos disputados pela seleção europeia tiveram atos e punições que extrapolaram as quatro linhas do campo.
Logo após a estreia dos sérvios no Mundial da Rússia, a Fifa puniu a federação local por causa do comportamento dos seus torcedores.
Durante a vitória contra a Costa Rica, por 1 a 0, os fãs exibiram uma bandeira ofensiva com teor político, que não foi revelado pela federação internacional, na arquibancada. A multa estabelecida foi equivalente a R$ 40 mil.
A punição foi a primeira imposta na Copa pelo grupo da Fifa de observadores de combate à discriminação. Desde 2015, o órgão tenta implementar uma série de medidas contra a intolerância e promover a diversidade no futebol.
Na partida seguinte, os sérvios foram provocados na derrota para a Suíça, por 2 a 1. Autores dos gols da vitória, Granit Xhaka e Xherdan Shaqiri foram os jogadores mais vaiados no início do jogo, mas deram a resposta em campo.
De origem kosovar, os dois irritaram os torcedores adversário ainda mais. Eles comemoraram os gols fazendo um sinal alusivo à águia de duas cabeças, símbolo da Albânia, origem étnica da maioria dos kosovares que lutaram na guerra de independência, no fim dos anos 1990, contra o domínio sérvio e a limpeza étnica promovida por eles.
Os jogadores suíços foram punido pela Fifa com uma multa de R$ 38 mil cada um pelas manifestações políticas.
O técnico da seleção, o bósnio Vladimir Petkovic, reprovou a atitude dos dois jogadores. “É claro que [na comemoração] as emoções aparecem. Nós todos precisamos deixar a política de lado no futebol. Nós precisamos focar o futebol, que é uma coisa que une as pessoas. Como eu disse antes, você nunca deve misturar política com futebol. É importante mostrar respeito”, disse.
Autor do gol da vitória, Shaqiri nasceu em Kosovo. Na partida, ele jogou com uma bandeira do seu país de origem na chuteira. No outro pé, ele colocou a bandeira suíça.
Jovan Surbatovic, secretário-geral da federação sérvia, reclamou das chuteiras e tentou convencer o árbitro a obrigar o jogador a mudá-las.
“Foi uma provocação. Estávamos jogando contra a Suíça, não contra Kosovo”, afirmou.
Albânia e Kosovo são membros da Fifa, e suas bandeiras são rotineiramente exibidas em jogos internacionais.
A Sérvia não reconheceu a declaração de independência de Kosovo, em 2008. Os nacionalistas sérvios consideram Kosovo como o lugar de nascimento de sua cultura.
Sérvia e Albânia são inimigas históricas. As tensões se tornaram mais graves após a guerra, que teve início após a extinção da Iugoslávia.
A primeira Copa disputada pela sérvia foi a da Alemanha. Na ocasião, o país jogou o Mundial de 2006 como Sérvia e Montenegro.
Pouco mais de uma semana antes do início da competição foi proclamada a independência de Montenegro, criando duas nações diferentes.
Mesmo assim, os dois países jogaram juntos, pois assim haviam disputado as eliminatórias e Montenegro ainda não contava com uma federação.
Sérvia tem o time mais alto desta Copa, enquanto Brasil tem um dos mais baixos
Tensão histórica
Região de Sérvia e Kosovo, na antiga Iugoslávia, é palco de conflitos há mais de duas décadas
1991-1992
1992-1995
1998-1999
Desintegração
Nascida em 1918, a Iugoslávia passou a ser formada por seis repúblicas comunistas depois da Segunda Guerra Mundial (1939-45). A união, porém, não resistiu à queda do Muro de Berlim e à escalada de tensões étnicas na região no fim dos anos 1980 e início dos 1990, quando quatro repúblicas declararam independência –apenas Sérvia e Montenegro permaneceram unidas
Independente em 1991 Independente em 1992
Guerra da Bósnia
Teve início quando os sérvio-bósnios cristãos ortodoxos (32% da população da Bósnia, ante 44% de muçulmanos) fundaram, com apoio da Sérvia, uma república dentro do território bósnio
Controlado por bósnios e croatas Controlado por sérvio-bósnios
Ratko Mladic chefiou o
Exército sérvio-bósnio durante o massacre em Srebrenica, quando 8.000 muçulmanos foram assassinados. Em 2017, ele foi condenado à prisão perpétua por um tribunal da ONU
Guerra de Kosovo
Região autônoma da Sérvia, Kosovo tem maioria esmagadora da população de origem albanesa. Ataques do grupo armado albanês KLA (Exército de Libertação de Kosovo) iniciam um conflito com os sérvios que só termina após bombardeios da Otan (aliança militar ocidental), aliada dos kosovares
Grupos étnicos de Kosovo, em %*