Folha de S.Paulo

Adeus, Portugal, olá, Brasil

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Ricardo Araújo Pereira Humorista, membro do coletivo português Gato Fedorento

Na hora da derrota, o torcedor inventa consolaçõe­s. Sim, Portugal já não está na Copa. Mas a Argentina foi eliminada à uma da tarde, enquanto Portugal só perdeu às cinco —o que significa que Ronaldo esteve mais quatro horas na Copa do que Messi. Chupa, Lionel.

Enfim, tudo serve. Agora, resta cumprir a tradição. O torcedor português acompanha a Copa de acordo com o seguinte modelo: torce por Portugal até a equipe nacional ser eliminada; torce para o Brasil daí em diante. No fundo, não é muito diferente do que fez d. Pedro 1º. Mas torcer para o Brasil dá trabalho porque é preciso ter o cuidado de não torcer para os brasileiro­s errados.

Neste domingo (1º), no Rússia x Espanha, havia três brasileiro­s em campo e mais o filho de um ex-internacio­nal brasileiro no banco de suplentes —nenhum dos quais nós desejamos que seja campeão do mundo.

Sorrimos ao ver a alegria do russo Mario Fernandes depois de eliminar a Espanha, mas só porque é fácil sorrir quando a Espanha é eliminada. Não nos deixamos enganar. Os brasileiro­s que a gente quer que vençam jogam de amarelo e tiveram a infelicida­de de ficar do lado que tem os adversário­s mais difíceis da Copa.

A Inglaterra teve muito mais sorte: tem caminho quase fácil para a final. Se ultrapassa­r a Colômbia, joga com o vencedor do Suécia x Suíça, um jogo que é também uma aliteração. E depois disso jogará com o vencedor do Rússia x Croácia.

Tudo porque Rashford, no jogo contra a Bélgica, falhou um gol feito. Se tivesse marcado, os ingleses teriam de enfrentar, provavelme­nte, Brasil e França, antes de chegarem à final. Mas o falhanço de Rashford tinha prêmio. Se a Inglaterra ganhar esta Copa, será em grande medida graças à incompetên­cia dele.

É justo que, se forem campeões do mundo, lhe agradeçam: “Este país não seria nada sem a sua gritante falta de jeito, Rashford. Como é que você conseguiu chutar ao lado só com o goleiro pela frente? A sua burrice foi genial. A rainha faz questão de premiar a sua extraordin­ária inaptidão, que ficará para sempre guardada em nossos corações. Muito obrigado, seu babaca”.

É preciso não esquecer que a Inglaterra é a pátria de Mr. Bean.

Para eles, pelos vistos, a história de um desastrado que acaba por sair por cima não é uma comédia: é um documentár­io.

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