Folha de S.Paulo

Vai, Tailândia!

- Ana Estela de Sousa Pinto Na Folha desde 1988, já atuou em política, economia, ciências, educação e fotografia

As 15h42 de sexta-feira (6) meu celular vibrou. Na foto, Gabriel, 10, chorava desesperad­o. Na minha TV, o motivo do pranto do meu sobrinho deslizava de joelhos pelo gramado. Com um canhão da entrada da área, De Bruyne mandara a bola pro canto direito do gol brasileiro e ampliara o placar. Bélgica 2 x 0 Brasil.

De impulso, mandei um áudio: “Não fica assim, Gabri. Um dia a gente ganha, outro a gente perde”. Então pensei “a gente, quem?” e emendei “e isso não tem nada a ver com o Brasil nem com você. É só um jogo de futebol”.

Cogitei entrar na jogada: “Olha, sua tia mesmo é a última colocada do bolão. Perder faz parte”. Mas seria meia verdade —nesta firma o lanterna recupera o dinheiro investido, e eu vinha jogando pelo regulament­o desde as oitavas de final.

Murmurei algo como “eu sei que é triste” e apelei para o Giménez.

“Até gente grande tem vontade de chorar quando perde, né? Viu aquele jogador do Uruguai?”

Então me ocorreu que o primeiro tempo nem tinha terminado ainda. Mandei logo outro áudio: “E ainda tem muito jogo. O Brasil ainda pode virar. O importante é a gente fazer o melhor que pode. Depois, se perder, perdeu”.

Falei tanto, mudei tantas vezes de argumento, atirei para todos os lados e não fiz o principal: perguntar a ele por que, afinal, chorava.

Ensinar os filhos a lidar com dor e frustração é um dos esportes nos quais mais tenho apanhado nesta vida. Bora levantar e seguir jogando.

A Alemanha ainda estava viva na Copa e vencia a Suécia quando 12 garotos de 11 a 16 e seu técnico de futebol, de 25 anos, terminaram o treino e foram explorar uma caverna no norte da Tailândia. Veio chuva forte, e o que se seguiu ocupa as manchetes desde então.

Neste domingo (8), quatro meninos que estavam mais fortes foram retirados com sucesso. Não foi uma decisão trivial. O resgate é tão delicado que até mesmo um militar experiente morreu nos preparativ­os. Mas novas tempestade­s podem inundar a câmara onde o grupo aguarda, e viver, Gabriel, é correr riscos.

A Copa do Mundo acaba no próximo domingo, mas há um único time pelo qual torcer: o dos meninos, seu técnico e as centenas de pessoas que trabalham há 15 dias para tirá-los todos de lá com vida.

Vai, Tailândia!

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