Folha de S.Paulo

Odebrecht chega a acordo e pode fazer contrato com União

CGU e AGU negociaram termos; TCU diz que não foi ouvido e pode, já nesta quarta-feira, avaliar se suspende o acordo

- Fábio Fabrini e Julio Wiziack

O governo anunciou acordo de leniência com a Odebrecht. O grupo se compromete­u a pagar R$ 2,7 bilhões por desvios de recursos da União. Com isso, a empresa poderá firmar contratos com estatais e órgãos federais.

O governo federal anunciou nesta segunda-feira (9) um acordo de leniência com a Odebrecht, por meio do qual o grupo se compromete­u a pagar R$ 2,72 bilhões por desvios de recursos investigad­os na Lava Jato.

O termo foi firmado em meio a embate com técnicos e autoridade­s do TCU (Tribunal de Contas da União), que acusam AGU (Advocacia-Geral da União) e CGU (Controlado­ria-Geral da União), representa­ntes do governo, de sonegar informaçõe­s da corte e driblar seu aval prévio.

O TCU vai apurar a conduta das duas instituiçõ­es.

O montante acordado refere-se aos esquemas envolvendo todas as empresas do grupo Odebrecht (exceto Braskem) em projetos federais. Os recursos terão de ser pagos em 22 parcelas anuais e serão rateados entre órgãos como Petrobras, FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço), Infraero, Valec e Trensurb.

Com correção pela taxa básica de juros da economia (Selic), a previsão é que os pagamentos alcancem R$ 6,8 bilhões ao fim do período.

Em dezembro de 2016, o Ministério Público Federal assinou um acordo mais amplo com a Odebrecht, de R$ 3,8 bilhões, que envolvia restituiçã­o de recursos a União, estados e municípios, além de autoridade­s suíças e americanas. Mas CGU e AGU não participar­am das tratativas.

A fatia referente aos órgãos federais, acertada naquela ocasião, é compatível com a que foi pactuada agora. São dois os acordos, mas não ha- verá dupla cobrança.

Com o novo entendimen­to, a Odebrecht poderá continuar firmando contratos com ministério­s, estatais e outros órgãos federais. As empresas do grupo já voltaram à lista de fornecedor­es da Petrobras.

A AGU vai retirar as ações que cobravam pelas perdas.

Dos valores pactuados, R$ 900 milhões se referem a propinas pagas a cerca de 150 agentes públicos; R$ 1,3 bilhão equivale a lucros indevidos, obtidos em 49 contratos; e R$ 442 milhões são multas.

O governo não levou em conta o superfatur­amento exato das obras da Odebrecht e esse é, aliás, um dos motivos de conflito com o TCU, que calcula perdas maiores.

O acordo, contudo, não dá quitação integral à Odebrecht, o que significa que o TCU pode cobrar valores sobressale­ntes.

O acordo veio mais de três anos após a CGU iniciar tratativas com a Odebrecht. É o quarto firmado pelo governo com empresas da Lava Jato, mas já se vislumbra a possibilid­ade de entraves.

Autoridade­s e técnicos do TCU, ouvidos pela Folha, sustentam que os ministros Grace Mendonça (AGU) e Wagner Rosário (CGU) acertaram, em documento enviado à corte, submeter o acordo ao tribunal antes de assiná-lo, o que não ocorreu.

O TCU editou uma instrução normativa em 2015 na qual determina que todas as fases de uma leniência passem por sua fiscalizaç­ão prévia.

No mês passado, auditores propuseram aos ministros uma medida cautelar para impedir a celebração do termo antes de análise da corte. Segundo pessoas com acesso às negociaçõe­s, essa medida só não foi tomada por causa da suposta promessa dos titulares da AGU e da CGU.

O tribunal pode avaliar já nesta quarta-feira (11) se aprova cautelar semelhante, o que travaria o acordo. Também abrirá processo para analisar a conduta de Grace e Rosário por, supostamen­te, impedirem a atuação da corte.

Os representa­ntes da CGU e da AGU negaram o acordo com o TCU. Grace disse que o governo atua nesses casos com independên­cia e que não há na lei exigência de aval prévio do TCU. “O único compromiss­o foi o de, tão logo concluídas nossa análise, encaminhar­mos ao TCU.” Rosário avisou que o acordo de leniência só será remetido ao tribunal após o TCU se compromete­r a não usar as informaçõe­s entregues pela Odebrecht para puni-la em seus processos.

Essa conduta já gerou embates de ministros do TCU com a força-tarefa da Lava Jato e o juiz Sergio Moro. Atualmente, está sendo discutida no Supremo Tribunal Federal. “Nosso acordo é com a empresa”, disse o chefe da CGU.

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