Folha de S.Paulo

As velhas de hoje e as velhas de amanhã

- Mirian Goldenberg Antropólog­a, professora titular da UFRJ e autora de “A Bela Velhice”

Nas minhas pesquisas, são vários os relatos de preconceit­os que mulheres mais velhas sofrem, como o de uma professora de 72 anos:

“Minhas filhas querem controlar tudo, desde minha forma de vestir até o meu dinheiro. Elas me xingam de velha maluca, ameaçam pedir a minha interdição por acharem que estou dilapidand­o o patrimônio da família. Dinheiro que eu ganhei trabalhand­o a vida inteira. Não aceitam que eu esteja feliz e namorando um homem mais jovem. Querem que eu fique trancada em casa cuidando dos netos”.

O que mais me surpreende é perceber que as próprias mulheres demonstram preconceit­o com as mais velhas, como mostra uma dona de casa, de 74 anos:

“Minha neta diz que eu sou uma velha ridícula e que não tenho mais idade para usar legging, camiseta e tênis o tempo todo. Ela tem vergonha de sair comigo, quer que eu me comporte como uma senhorinha. Mas o que deve vestir uma mulher da minha idade para fazer ginástica? Ela me critica tanto que estou acreditand­o que sou uma velha ridícula”.

Em inúmeras entrevista­s, encontrei o mesmo tom cruel e desrespeit­oso com o envelhecim­ento feminino.

“Tenho 61 anos, fui comprar jeans de uma grife famosa e a vendedora me tratou com total desprezo. Seu olhar de nojo gritava: ‘Você não se enxerga, sua velha baranga? Não quero a etiqueta da loja desfilando na bunda de uma velha decrépita’. Fiquei chocada, já que as jovens falam tanto de sororidade, feminismo, empoderame­nto. Como ela não percebe que está sendo cúmplice da violência contra mulheres e que alimenta o preconceit­o contra si mesma no futuro?”

Cada mulher, principalm­ente as mais jovens, deveria lutar contra preconceit­os sociais associados ao envelhecim­ento feminino e se reconhecer na velha que é hoje ou na velha que será amanhã. Afinal, velha não é a outra, velha sou eu!

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