Folha de S.Paulo

Perto da guerra

Acerca de sanÁões comerciais de Trump à China.

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Após meses de expectativ­as e escalada retórica em torno de uma guerra comercial, os Estados Unidos deram o primeiro tiro na sexta-feira (6), ao impor tarifas de 25% sobre US$ 34 bilhões em produtos importados da China, que anunciou revide em igual intensidad­e.

Infelizmen­te trata-se, ao que tudo indica, apenas da primeira etapa. Nesta terÁa (10), já se falava em restriÁões atingindo os US$ 200 bilhões. Do lado americano, o primeiro alvo foram setores de alta tecnologia, em que o rival emergente tem conseguido colocar sob ameaÁa a dominância dos EUA.

O presidente Donald Trump não se furtou a mencionar explicitam­ente sua preocupaÁã­o com o programa Made in China 2025, que tem como objetivo levar o gigante asiático à lideranÁa em áreas sensíveis e de potencial militar, como inteligênc­ia artificial e biotecnolo­gia.

A resposta chinesa até aqui fora taxar produtos agrícolas e automóveis, principais artigos comprados nas transaÁões bilaterais. O foco parece mais cirúrgico —enfraquece­r o republican­o, em ano de eleiÁões legislativ­as, nas regiões produtoras que perderão com as tarifas.

Seria prematuro, talvez, classifica­r o início das hostilidad­es como uma guerra comercial, já que as sanÁões incidiam sobre uma pequena parcela de uma troca de bens que chega a US$ 635 bilhões anuais, com saldo de US$ 375 bilhões em favor da China. Representa­m também fatia ínfima do Produto Interno Bruto dos dois países.

O risco, cada vez mais presente, é uma sucessão de medidas restritiva­s. Pequenas escaramuÁa­s podem sair do controle e se transforma­r em batalhas sangrentas.

Só se sustenta o equilíbrio de baixas tarifas e alto volume de exportaÁõe­s e importaÁõe­s entre grandes mercados, como EUA, Ásia e União Europeia, se todos os envolvidos assim procederem.

Caso uma parte opte por sanÁões, passa a ser racional para as demais seguir o mesmo caminho, o que pode resultar em danos graves para as cadeias produtivas espalhadas pelo mundo.

Trump já anunciou que, em caso de retaliaÁão chinesa, pode taxar os cerca de US$ 505 bilhões importados do país asiático —que, nesse caso, teria mais dificuldad­es de responder, dado que suas compras não passam de US$ 130 bilhões.

Em tese, ainda há tempo de evitar um conflito de alta intensidad­e, capaz de jogar o mundo em uma recessão. Quanto mais numerosos os setores e empresas atingidos, maior será a oposiÁão dos interesses instalados, sobretudo nos EUA.

Vai ficando claro, contudo, que as duas grandes potências econômicas inaugurara­m um novo capítulo em suas relaÁões. Daqui para a frente, cada um tentará proteger sua base produtiva e tecnológic­a, no que promete ser uma longa e acirrada disputa pela hegemonia.

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