Folha de S.Paulo

Gestão espúria

Sobre investigaÁ­ão de propina na pasta do Trabalho.

-

Na burocracia brasiliens­e nem sempre são claras as divisas entre as estruturas dedicadas a políticas de Estado e as que simplesmen­te abrigam aliados políticos do governo de turno —e seus interesses por cargos e verbas.

Tome-se o caso do Ministério do Trabalho, novamente foco de desgastes vexatórios para a administra­Áão Michel Temer (MDB). A pasta, mastodônti­ca, dispõe de R$ 85,7 bilhões, a quinta maior dotaÁão orÁamentár­ia da Esplanada, só atrás de Desenvolvi­mento Social (que incorporou os encargos previdenci­ários), Saúde, EducaÁão e Defesa.

A fatia amplamente majoritári­a dessa verba está relacionad­a ao pagamento do seguro-desemprego e do abono salarial, além de repasses obrigatóri­os de recursos do Fundo de Amparo ao Trabalhado­r (FAT) para financiame­ntos do BNDES.

Nada disso demanda a atenÁão de um ministro —embora vultosas, as operaÁões seguem regras automática­s, não sujeitas a interferên­cias administra­tivas. Nem são tais programas que despertam o apetite de partidos como o PTB e o Solidaried­ade, ocupantes do órgão desde o início da gestão Temer.

Na tradiÁão do presidenci­alismo nacional, siglas fisiológic­as apoiam o governo em troca do acesso a postos de comando no Executivo que permitam o manejo de dinheiro, em montantes no geral menos vistosos, ou a distribuiÁ­ão de favores oficiais. Em tal modelo, o caminho da ineficiênc­ia à ilicitude não costuma ser longo.

De acordo com a Polícia Federal, essa linha foi cruzada na pasta do Trabalho. A OperaÁão Registro Espúrio, que investiga um esquema de cobranÁa de propinas para a concessão de registros sindicais, resultou na queda de Helton Yomura, titular apadrinhad­o pelo comando petebista.

Que uma atividade tão comezinha esteja ao alcance da ingerência partidária dá ideia do manancial de oportunida­des para desmandos diluídas em um OrÁamento de mais de R$ 1,3 trilhão. Também evidencia como são ingênuos planos de ajuste da máquina administra­tiva baseados apenas em metas de reduÁão do número de ministros.

Muito mais complexa, a tarefa envolve profission­alizar procedimen­tos burocrátic­os e, quando possível, eliminá-los. Porém os limites para tanto estarão sempre definidos pelas necessidad­es políticas do Palácio do Planalto.

Aliás, será interessan­te observar nos próximos anos como o avanÁo aparenteme­nte irreversív­el do combate à corrupÁão afetará a formaÁão de coalizões. O moribundo governo Temer, para o bem ou para o mal, já não serve de exemplo.

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil