Folha de S.Paulo

Les Bleus, vencendo ou não, questionam ‘identidade francesa’

- Nelson de Sá Cobre mídia e cultura na Folha. Foi correspond­ente, secretário-assistente e editor da ilustrada

Azuis heroicos, saudou a manchete do Le Figaro. Azuis defensivam­ente magníficos, especifico­u o Le Monde. Mas as cores que ambos e outros ressaltava­m nas fotos eram outras. Ao longo da partida, o Figaro fixou uma de Umtiti, nascido em Camarões, marcando Lukaku, filho de congoleses.

Como destacou o Monde, a seleção é um “objeto político” na França, mas não por atrair o presidente Emmanuel Macron a São Petersburg­o. Os azuis são “a caixa de ressonânci­a do questionam­ento da identidade francesa”.

“Eles sempre refletiram a história da imigração”, desde Kopa nos anos 1950, filho de poloneses, até Zidane campeão em 1998, filho de argelinos. Mas desde aquela Copa, 20 anos atrás, vencer é uma prova de “integração bem-sucedida” e perder mostraria que “falta sentido de comunidade” ao país.

Por outro lado, o Washington Post alertou contra os exageros festivos que dão a França como “o último time africano”. Sua editora de opinião, filha de ganense e nigeriano, questiona se “deveríamos torcer então” para o Brasil, que tinha jogadores negros. Afirma que prefere torcer para que as seleções africanas voltem a participar do mata-mata.

E lembra que a França acaba de tirar a expressão “raça” de sua Constituiç­ão, acrescenta­ndo, por fim: “Mas eu entendo. Existe uma alegria em saber que racistas e políticos anti-imigrantes na França têm de lidar com o fato de que as esperanças com Les Bleus recaem sobre os ombros dos negros africanos”.

A Inglaterra parece não querer ficar atrás e enfatiza, por sites como The Canary e o Guardian, que sua seleção tem 47,8% de filhos de imigrantes, “inclusive o capitão Kane, cujo pai é irlandês”. Na francesa, 78%. O Museu da Migração de Londres chegou a mostrar como seria a Inglaterra titular sem filhos de imigrantes, restando só cinco jogadores, como destacou o Canary, provocando a “extrema direita”.

Para o South China Morning Post, de Jack Ma, dono do Alibaba, e até para o financeiro japonês Nikkei, dono do Financial Times, a Copa já tem “vencedor”: os anunciante­s chineses, não só nas placas mas nos intervalos com Messi vendendo laticínios Mengniu. O conglomera­do Wanda é um dos patrocinad­ores oficiais —ao lado de empresa como Visa e Coca-Cola. E eles, inclusive o Alibaba, já estão se preparando para as próximas Copas e Olimpíadas.

São tantos anúncios e torcedores chineses na Rússia que até o Huanqiu/Global Times, jornal do PC, noticiou a piada que tomou o país, do apresentad­or Bai Yansong, da CCTV: “Os únicos chineses que não apareceram na Copa foram os jogadores da seleção”.

 ??  ?? Na agência Xinhua, o magnata Jack Ma no estádio para a primeira semifinal
Na agência Xinhua, o magnata Jack Ma no estádio para a primeira semifinal
 ??  ?? Lukaku marcado por Umtiti, na foto destacada pelo francês Le Figaro
Lukaku marcado por Umtiti, na foto destacada pelo francês Le Figaro
 ??  ?? Como ficaria o time inglês sem filhos de imigrantes
Como ficaria o time inglês sem filhos de imigrantes

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil