Folha de S.Paulo

Petição endereçada a...

- Peço-lhe, camarada químico, preencha o senhor mesmo!

Ancora a arca. Raios, para cá! Cais.

Ei!

Jogue um cabo!

E acabo

de sentir com os ombros o peso dos peitoris de pedra. O sol

secou a noite do dilúvio com seu calor. Na janela,

encontro o dia com ardor.

Do globo somente — o monte Kilimanjar­o. Do mapa africano somente — o Quênia.

O globo é uma cabeça calva.

Eu sobre o globo

me englobo de dor.

O mundo gostaria

de patabraçar os peitos-montanhas neste monte de dor.

Para que dos pólos,

por todas as moradias, role a lava pétrea-derretida, é assim que eu gostaria de cair no choro, urso-comunista.

Meu pai

é um nobre de quatro costados, a pele das minhas mãos é terna

Talvez, beba os dias com versos num trago, e sem nunca ter visto um torno.

Mas com a minha respiração, com as batidas do coração, com a voz, com cada ponta de cabelo

arrepiado de medo, com os buracos das narinas,

com os pregos dos olhos, com os dentes arreganhad­os na rosnadura ferina, porcoespin­ho a pele,

com as sobrancelh­as unidas em ira, com um trilhão de poros, literalmen­te —

com todos os poros no outono, no inverno, na primavera, no verão, de dia,

no sono não aceitarei, odeio isto

tudo. Tudo

o que em nós está cravado pelo passado de escravidão,

tudo, enxame mesquinho, entranhado no dia-a-dia

até no nosso

regime bandeirrub­ro. Não darei o gostinho de ver

que calei meus versos com um tiro. Não cantarão tão cedo o réquiem ao meu talento.

Podem me matar emboscada na esquina

com uma faca talvez. Os D’Anthès não mirarão a minha fronte. Quatro vezes envelheço — quatro vezes rejuvenesç­o, até que a morte me apareça defronte. Onde quer que eu morra,

morrerei cantando. Em qualquer buraco enterrado, sei —

com mérito estarei deitado. com os tombados sob a bandeira vermelha. Mas seja qual for a minha sorte —

a morte é a morte.

Terrível — não amar,

terror — não ousar.

Por todos — uma bala,

por todos — uma faca.

E para mim, quando será minha vez? E para mim o quê, então?

Talvez,

lá nas profundeza­s da infância, encontrare­i dez dias suportávei­s. E eles?!

Queria o mesmo destino para mim! Mas não.

Vejam —

não tenho a mesma sorte! Se eu acreditass­e no além!

Fácil viagem experiment­al. Basta

apenas estender a mão — a bala,

num piscar de olhos, traça retumbante o caminho mortal. O que posso fazer, se eu com toda a pressão, com a plenitude do coração, nesta vida, neste mundo tinha

e tenho fé.

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