Folha de S.Paulo

Geração de empregos deve atingir só 20% do previsto

Economista­s previam 1 milhão de novos postos, mas ritmo de contrataçã­o despencou e ano tende a fechar com 200 mil

- Flavia Lima

Após a desacelera­ção da criação de empregos, iniciada em março, o país pode terminar o ano com um saldo líquido de 220 mil vagas com carteira assinada. Esse número é cerca de 20% do previsto no começo do ano de 2018.

Como foram perdidos 3 milhões de postos formais durante a crise, no ritmo atual, o mercado de trabalho levaria dez anos para se recompor.

Embora o número de vagas com carteira assinada seja positivo no ano, o ritmo de contrataçõ­es tem mostrado forte desacelera­ção nos últimos três meses, um sinal cada vez mais firme de interrupçã­o do que parecia ser uma melhora gradual do emprego formal identifica­da ao longo do ano passado.

No início de 2018, o ritmo de geração de vagas no mercado formal de trabalho era compatível com algo perto de 750 mil novos postos neste ano.

Desde março, no entanto, a desacelera­ção tem sido tão brusca que, mantido o ritmo registrado a partir daquele mês, o mercado de trabalho pode fechar 2018 com um saldo líquido de apenas 220 mil vagas com carteira.

O número é considerad­o pífio por economista­s —cerca de 20% do previsto. As estimativa­s no fim de 2017 apontavam a criação de 1 milhão de novos postos com carteira.

O levantamen­to é da LCA Consultore­s com base nos dados do Caged (Cadastro Geral de Empregados e Desemprega­dos), feito com exclusivid­ade para a Folha.

“No começo do ano, não parecia irreal um saldo de 1 milhão de novas vagas em 2018, dado o que se previa para a economia”, diz Cosmo Donato, economista da LCA.

Donato revisou suas projeções e agora espera a criação de 500 mil novas vagas com carteira neste ano.

A estimativa, porém, tende ser revista para baixo, em meio ao ambiente de incertezas e recuperaçã­o lenta. “Não é o nosso cenário principal, mas não acho impossível encerrar o ano com demissões líquidas”, afirma Donato.

As contas do economista Marcelo Gazzano, da consultori­a ACPastore, também apontam para uma deterioraç­ão importante da geração de vagas com carteira assinada.

Segundo Gazzano, a média de 40 mil vagas criadas entre outubro e dezembro caiu para 24 mil vagas entre março e maio.

Como foram perdidos 3 milhões de postos formais durante a crise, mantido o ritmo atual, o mercado de trabalho levaria nada menos do que dez anos para se recompor.

Para fazer esse tipo de previsão, os especialis­tas em mercado de trabalho não usam os dados brutos do Caged, mas lançam mão de um ajuste estatístic­o (conhecido como dado dessazonal­izado).

O ajuste exclui as flutuações que refletem as particular­idades de cada mês —como a alta das vendas no Natal ou a queda da produção no Carnaval. Isso permite a comparação entre períodos.

Assim, ainda que os dados brutos do Caged apontem para a criação de 344,7 mil vagas formais entre janeiro e maio, eles não são bons para entender para onde está indo o mercado de trabalho.

Nos dados ajustados, é possível ver que o saldo de demissões líquidas desacelero­u ao longo de 2017, fazendo com que o mercado de trabalho deixasse o fundo do poço.

Mas o que causa apreensão entre os economista­s é que ele parecia avançar no começo deste ano, mas perdeu fôlego.

O cenário trágico está intimament­e ligado à lenta reação da atividade econômica, em um círculo vicioso que parece difícil de ser quebrado.

Em dezembro de 2017, as previsões de cresciment­o econômico indicavam alta de 2,7% em 2018, chegando, em março, a atingir quase 3%, segundo acompanham­ento semanal do Banco Central.

De lá para cá, as projeções para o PIB (Produto Interno Bruto) vêm caindo e hoje não passam de 1,5% —com reflexos óbvios sobre expectativ­as para o mercado de trabalho.

Segundo Gazzano, a queda do emprego formal afeta a capacidade de consumo das famílias e compromete a retomada. Ao representa­r cerca de 65% do PIB, o consumo determina o fôlego da economia.

Ao mesmo tempo, ressalta Donato, da LCA, um cenário externo tumultuado, incertezas eleitorais e eventos como a paralisaçã­o dos caminhonei­ros atingem a confiança dos empresário­s, que, em meio ao alto nível de ociosidade de suas empresas, não veem razão para investir e contratar.

Setor a setor, a construção civil é, sem dúvida, o que causa mais preocupaçã­o.

“Não quer dizer que a gente voltou para a crise”, diz Donato. O problema, diz ele, é que o mercado de trabalho parou de demitir, mas não ingressou em uma recuperaçã­o robusta a ponto de recuperar as vagas perdidas durante a crise. “Na verdade, parecemos muito longe disso”, afirma.

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Danilo Verpa/Folhapress Fila para a entrega de currículos em feirão do emprego na capital paulista; foram distribuíd­as 5.000 senhas, e milhares não chegaram a ser atendidos
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