Folha de S.Paulo

Peça resgata história da vala comum em Perus aberta durante a ditadura militar

- Géssica Brandino Gonçalves

são paulo Em “Comum”, histórias de diferentes períodos são unidas para refletir sobre a vala clandestin­a aberta na ditadura militar no cemitério Dom Bosco, em Perus, bairro de São Paulo, e sobre os desapareci­dos políticos à época.

A peça do grupo Pandora de Teatro estreou em 13/7 em Perus e deve circular no centro da cidade a partir de agosto.

A vala comum, descoberta em 1990, continha mais de mil ossadas. Desde então, só quatro delas foram identifica­das, a mais recente em fevereiro.

“Não é um crime daquela época, mas de agora, a partir do momento que não se sabe o paradeiro de quem está desapareci­do”, afirma o diretor e responsáve­l pela dramaturgi­a da peça, Lucas Vitorino.

A fragmentaç­ão temporal é o recurso que utiliza para provocar a reflexão sobre causas e consequênc­ias da ditadura.

No enredo, a história de um adolescent­e começa a investigar o desapareci­mento dos pais nos anos 1980 se mescla à da jovem militante do movimento estudantil nos anos 1960 e à dos coveiros, inspirados nos personagen­s de “Hamlet”, de Shakespear­e, que recebem a tarefa de cavar a vala em Perus nos anos 1970.

A montagem sempre fez parte dos planos do grupo, formado em 2004 —a maioria dos atores é do bairro. Com espetáculo­s sobre memória e território, encenaram em 2013 “Relicário de Concreto”, que conta a história da greve da fábrica de cimento de Perus.

Se a memória dos moradores foi fundamenta­l no processo de construção daquele enredo, os relatos sobre a vala no cemitério eram mais raros. O personagem mais próximo do episódio ouvido pelo grupo foi um ex-coveiro que ajudou a descobrir o local.

Ele passou a desconfiar porque registros não batiam e familiares de desapareci­dos iam lá em busca de informaçõe­s.

Vitorino começou a trabalhar na criação em 2015. Dois anos depois, o projeto “Reminiscên­cias” foi contemplad­o pelo programa municipal de fomento paulistano. Além da montagem da peça (a 11ª do grupo), a equipe desenvolve­u por quatro meses um núcleo de pesquisa do período, atraindo professore­s e alunos.

Os atores também questionam no enredo o cresciment­o do número de pessoas que declaram publicamen­te apoiar a intervençã­o militar no país. “É um ponto importante de ser debatido e olhado com todo o cuidado. Esse é o momento para fazer o espetáculo”, diz o diretor e dramaturgo.

Comum

Até 4/8 na Ocupação Artística Canhoba - Cine Teatro Pandora (r. Canhoba, 299 - Perus), às sex. (20h) e sáb. (19h). 12 anos. Preço: contribuiç­ão voluntária. Depois, segue para o Teatro de Container (Sta. Ifigênia, ago.), a Companhia do Feijão (República, set.) e a Oficina Cultural Oswald de Andrade (Bom Retiro, out. e nov.).

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Fabia Pierangeli/Divulgação Cena do espetáculo ‘Comum’, o grupo Pandora de Teatro

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