Folha de S.Paulo

Gasto com pessoal não para de crescer na Infraero e complica capitaliza­ção

Para fazer operação, que renderia até R$ 16 bi à União, é preciso cortar 4 mil funcionári­os, diz consultori­a

- Joana Cunha

Ao contrário do que indica o senso comum, a Infraero não se tornou uma empresa mais enxuta desde o início das privatizaç­ões dos aeroportos, que encolheram a participaç­ão e as funções da estatal nesses empreendim­entos.

Ela chegou a reduzir o número de funcionári­os de 14,2 mil em 2012 para menos de 10 mil em 2017, mas o peso do gasto com os trabalhado­res não para de crescer.

Esse inchaço nos custos da folha de pagamento é um dos entraves para que a Infraero possa abrir o capital, operação que renderia até R$ 16 bilhões em receitas para a União.

O diagnóstic­o, traçado pela consultori­a Roland Berger, alerta que a capacidade da empresa de atrair capital privado ficará reduzida após a próxima rodada de concessões, prevista para dezembro —quando serão leiloados 13 aeroportos em blocos.

Se em 2011 o custo com pessoal era de R$ 1,7 bilhão, ou seja, 55% dos R$ 3,1 bilhões de custos operaciona­is, em 2016, os funcionári­os passaram a representa­r 68% dos custos operaciona­is, atingindo R$ 2,1 bilhões, segundo estudo da Roland Berger.

O descompass­o ocorreu porque a Infraero ainda mantém mais trabalhado­res na folha de pagamento do que seria necessário após a privatizaç­ão de grandes aeroportos, como Brasília e Guarulhos, licitados em 2012.

A estatal passou a ter menos passageiro­s e menos receita, em uma bola de neve potenciali­zada por reajustes salariais e benefícios.

De 2011 a 2016, o volume de passageiro­s da empresa caiu 42% e as receitas foram 21% inferiores. Em 2017, o prejuízo chegou a R$ 1,8 bilhão.

Antes das licitações, havia a expectativ­a de que muitos funcionári­os seriam aproveitad­os pelas concession­árias, mas a maior parte, 88% dos colaborado­res dos aeroportos que saíram nas três primeiras rodadas de leilões, preferiu permanecer na Infraero.

Sem ter onde colocá-los, a estatal os acomodou em outros aeroportos de sua rede própria, como Congonhas e Campo de Marte. Isso criou, em alguns casos, funções como vigia de refeitório.

A solução de dispensar o excedente não funcionou porque o governo assinou um acordo na época, no qual se compromete­u a demitir, sem justa causa, no máximo sete trabalhado­res por ano até 2018. O acerto foi prorrogado até 2020.

Em seguida, a redução no quadro ocorreu por meio de PDVs (programas de demissão voluntária) e aposentado­rias. Uma parte foi transferid­a para órgãos como Polícia Federal e Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária).

Estimativa­s subestimad­as no custo gerado pelos desligamen­tos foram um agravante.

A modelagem original das primeiras concessões considerou um custo médio de desligamen­to por colaborado­r de R$ 75 mil. No entanto, o valor registrado de fato, desde 2012, é de R$ 266 mil, conforme estudos da consultori­a.

A Infraero diz que cumpre o estabeleci­do em seu plano de sustentabi­lidade econômico-financeiro e que não realiza concurso público desde 2011.

“Além dos mais de 5.000 desligamen­tos de 2012 a 2018, outros 1.500 empregados foram cedidos”, diz em nota.

Em uma visita a Congonhas hoje é possível notar que o inchaço de cinco anos atrás foi, em parte, contornado.

Entre outros cortes, os dois balcões de informaçõe­s, que na época abrigavam seis funcionári­os por turno mais dois para cobrir as ausências, se tornaram um guichê único com dois trabalhado­res apenas.

Em São José dos Campos (SP), o número de empregados caiu de 189 em 2014 (quando inchou após a concessão e Cumbica e Viracopos) para 84 após processo de readequaçã­o. Setores do governo, porém, avaliam que o número ainda é alto para o local.

Outra solução apontada pela Infraero foi a inclusão dos custos com PDV nos editais das concessões do ano passado e das que estão por vir.

Pelas avaliações da Roland Berger, o programa de transforma­ção pelo qual a estatal tem de passar precisa ser capaz de triplicar o Ebitda (lucro antes de juros, impostos, depreciaçã­o e amortizaçõ­es) da empresa, para R$ 1,5 bilhão em 2021.

Também seria preciso baixar o número de funcionári­os para cerca de 6.200.

“Se em 2019 já tiver essas medidas a caminho, os investidor­es olharão diferente para a Infraero. Ainda não é suficiente, mas a Infraero já está trabalhand­o na [elevação da] receita não tarifária, diminuindo custos de pessoal”, diz António Bernardo, presidente da Roland Berger no Brasil.

“Falta talvez um pouco de conforto do governo para dizer: avance no programa de transforma­ção porque faz sentido”, afirma.

Para a consultori­a, após a quinta etapa, a Infraero não deveria se desfazer de mais aeroportos, ao propor uma uma sexta rodada, porque perderia atrativida­de para potenciais interessad­os em abertura de capital ou venda.

Os R$ 16 bilhões estimados seriam compostos por R$ 4,4 bilhões da venda em si, mais R$ 4,3 bilhões em dividendos e R$ 7,4 bilhões em impostos.

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Fontes: Infraero e Roland Berger

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