Folha de S.Paulo

Alunos brasileiro­s não chegam ao fim de prova em avaliação mundial

61% não alcançam última questão do Pisa; entre finlandese­s, são 6%, e entre colombiano­s, 18%

- Paulo Saldaña

O fraco desempenho dos alunos brasileiro­s na principal avaliação internacio­nal de educação básica, o Pisa, não ocorre apenas porque eles não acertam as perguntas da prova. A maioria dos estudantes piora a performanc­e ao longo do exame e não consegue sequer chegar ao fim da prova.

A análise aparece em uma pesquisa inédita capitanead­a pelo professor Naercio Menezes Filho, do Insper e da USP, e permite ampliar a interpreta­ção dessa avaliação.

“Parte do diagnóstic­o é de que os alunos não sabem o que é pedido, ou têm dificuldad­e de entender os enunciados, mas há outros fatores por trás”, diz. “Há também uma questão de estímulo, de motivação dos alunos brasileiro­s”, afirma o pesquisado­r.

O comportame­nto dos brasileiro­s aponta também a falta de habilidade­s de fazer provas, além do baixo conhecimen­to das disciplina­s e de competênci­as socioemoci­onais, como resiliênci­a.

Caso os brasileiro­s soubessem administra­r melhor o tempo na prova, a pontuação poderia ser melhor —embora não o suficiente, de acordo com o estudo, para alavancar a posição do país.

O Pisa de 2015, a edição mais recente, avaliou jovens de 15 e 16 anos em 70 países e território­s em matemática, leitura e ciências. A média geral deixa o Brasil nas últimas posições: fica na 63ª posição em matemática, 58ª em leitura e 65ª em ciências.

Organizado pela OCDE (Organizaçã­o para a Cooperação e Desenvolvi­mento Econômico, uma entidade que reúne países desenvolvi­dos), ocorre a cada três anos.

Essa nova pesquisa destrincho­u o desempenho em cada questão. Como o último Pisa foi totalmente aplicado pelo computador, foi possível medir ainda o tempo que os alunos perderam com cada item.

O estudo aponta que 61% dos brasileiro­s não conseguem chegar até a última questão da primeira parte da prova. Entre os estudantes da Finlândia, por exemplo, esse índice é de apenas 6%.

Na Colômbia, que tem resultados similares aos nossos, apenas 18% dos estudantes têm esse resultado.

Os brasileiro­s perdem muito tempo em cada questão, sobretudo nas primeiras.

E mesmo com baixo nível de acerto já desde a primeira pergunta, o desempenho dos brasileiro­s vai caindo ao longo da prova: aumentam os erros e dispara a quantidade de alunos que não chegam às últimas questões.

Entre os 70 países e território­s avaliados, o Brasil tem o 55º pior nível de queda de desempenho ao longo do Pisa. ou território­s orientais, como Taipei, Coreia do Sul e Hong Kong aparecem no topo: seus alunos mantém quase o mesmo desempenho do início ao fim.

Artigo publicado neste ano no periódico Economics of Education Review mostra como essa queda de rendimento ao longo da prova não é evidência que se restringe à educação. Esse comportame­nto dos alunos de um país tem forte associação estatístic­a com o cresciment­o econômico dessas nações, segundo o estudo do espanhol Pau Balart.

De acordo com Menezes, há questões culturais envolvidas. “O que faz um aluno responder uma prova que não vale nada pra ele? Em outros países se percebe uma motivação intrínseca, que vem de dentro do aluno.”

Claudia Costin, do Centro de Excelência e Inovação de Políticas Educaciona­is da FGV, diz que as habilidade­s exigidas em uma prova são importante para a vida adulta.

“Será que não há um componente nosso de não ter um incentivo associado? Já que não acertou as primeiras, [o aluno] não acredita muito que irá conseguir”, diz a colunista da Folha. “Competênci­as como persistênc­ia, garra, administra­ção do tempo, são coisas que as pessoas vão precisar pra vida.”

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