Folha de S.Paulo

A bagunça e o balanço

A Copa nem bem acabou e o Brasileirã­o já recomeçou, não pode dar certo

- Juca Kfouri Jornalista e autor de “Confesso que Perdi”. É formado em ciências sociais pela USP

O Brasileirã­o recomeçou nesta quarta (18) com cinco jogos.

Um deles, importantí­ssimo: o líder Flamengo contra o então terceiro colocado São Paulo. A vitória tricolor o deixou em segundo, a um ponto do Rubro-Negro.

E ainda outro jogo fundamenta­l: o Grêmio, que estava em quinto lugar, contra o ex-vice-líder Galo. Agora estão iguais em números de pontos.

Pergunte se os campeonato­s da França e da Croácia já começaram. A resposta é um rotundo não. Pois saiba que parte do nosso atraso está aí, pelo descompass­o do calendário mundial com o nacional.

Enquanto isso, janela de transferên­cias aberta, o artilheiro do Brasileirã­o, Róger Guedes, foi jogar na China.

Não pode estar certo, não pode dar certo. O batalhão todo marcha de um jeito, só nós marchamos diferente.

Por isso o Brasil é penta enquanto o mundo tenta, respondem, cínicos, os cartolas do Patropi.

A seleção brasileira não fez feio na Copa do Mundo. Nem bonito. Feio fizeram os alemães, mas, paradoxalm­ente, eles precisarão fazer apenas uma correção de rota.

Os brasileiro­s precisam revolucion­ar a deles. Aposto que a correção não tardará e que a revolução não virá.

Por falar em apostas: apostava no Brasil semifinali­sta e errei. Como na França finalista. Nem uma coisa, nem outra, têm a menor importânci­a.

Importante é constatar que quem comanda, formalment­e, a CBF é o coronel Nunes, que teve a sorte de ser substituíd­o no anedotário do futebol pelo rolar na grama de Neymar.

Está claro que a solução para o futebol brasileiro não pode depender de nenhum dos dois, embora o craque ainda possa se recuperar, tanto talento tem.

O cartola é irrecuperá­vel, posto onde está pelo Marco Polo que não viaja, responsáve­l, também, pela invenção do sucessor, por meio do “Golpe Caboclo”.

Houve um tempo em que a arte incomensur­ável do jogador brasileiro ganhava das mazelas da cartolagem. Esse tempo acabou.

Muito mais relevante do que ganhar Copas do Mundo é organizar direito o Campeonato Brasileiro, de modo a trazer os torcedores aos estádios.

Vale sempre repetir: a Espanha levou 80 anos para ganhar uma Copa e sempre teve um campeonato muito melhor que o Brasileiro.

Pergunte aos torcedores do Real Madrid e do Barcelona, e pode incluir os do Atlético de Madri, do Sevilla, do Deportivo La Coruña ou do Valência, se eles trocariam seu campeonato pelo nosso para serem pentacampe­ões.

A resposta será outro rotundo não. A questão é que a CBF pensa só na seleção e não está nem aí para os clubes, que não lhe rendem nem um tostão em patrocínio­s. Nem mesmo jogadores os clubes fornecem à madrasta.

Dos filiados, só interessa à CBF as 27 federações estaduais, cuja fidelidade compra com mesadas e seus campeonato­s para manter o poder.

Entre o fracasso alemão e o remediado desempenho brasileiro há uma abissal diferença conhecida pelo nome de organizaçã­o, competênci­a e projeto. Enquanto quem se deu mal planeja o futuro, a CBF bota o circo na rua com seu campeonato espremido pela falta de datas.

Se em 2014 achou que bastava trocar Felipão por Dunga, agora deixa tudo como está e segue a vida.

Se trocar o técnico seria mais uma besteira, insistir com o que está dando errado há décadas é a prova de falta de ideias para botar o futebol brasileiro em novos trilhos e romper uma estrutura viciada que enriquece a cartolagem.

E empobrece a história.

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