Folha de S.Paulo

O peso do centrão

Apoio esperado de partidos fisiológic­os dará alento à candidatur­a de Alckmin; bloco anacrônico ainda consegue manter influência na política nacional

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Sobre acordo entre partidos fisiológic­os e Alckmin.

Poucas vezes se viu uma sucessão presidenci­al tão cercada de indefiniçõ­es como as que têm caracteriz­ado o atual momento. A desagregaç­ão partidária e o desgaste de lideranças imprimem, sem dúvida, elevado grau de incerteza à campanha que se aproxima.

Ao menos num ponto, todavia, os entendimen­tos com vistas ao pleito de outubro parecem acomodar-se num leito já conhecido.

Depois de uma fase de oscilações e desencontr­os, o chamado centrão prepara-se para anunciar seu apoio ao pré-candidato tucano à Presidênci­a, Geraldo Alckmin.

Os comandos de DEM, PP, PR, Solidaried­ade e PRB abandonam, assim, as perspectiv­as de um acordo com Ciro Gomes (PDT) ou com Jair Bolsonaro (PSL), em favor de um nome que, embora menos favorecido pelas atuais pesquisas de opinião, há de ser-lhes mais confiável.

Não foi diverso, para começar, o esquema que deu sustentaçã­o ao governo Fernando Henrique Cardoso, nos anos 1990.

Se o paralelo parece distante no tempo, é inegável que, do ponto de vista programáti­co, persistem as afinidades entre um partido de perfil mais liberal e reformista, como o PSDB, e a colcha de retalhos fisiológic­a e conservado­ra que se costura à sua volta.

A aliança em formação tende a fazer mais sentido, com efeito, do que a conjunção resultante de um apoio a Ciro Gomes, cuja confusa mensagem eleitoral envereda pelo campo da esquerda, ou com o direitismo simplório de Bolsonaro.

Não que amálgamas desse tipo sejam impossívei­s. Com exceção do DEM, as siglas do centrão deram longo respaldo a governos petistas, cabendo ao pragmatism­o do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva viabilizar suas demandas enquanto mantinha acesas as esperanças e ilusões da militância.

Tal arranjo desaguou, como se sabe, em escândalos detectados em escala inédita nos episódios do mensalão e da Lava Jato —e, mais à frente, em rompimento com a gestão econômica e politicame­nte inepta de Dilma Rousseff.

Se confirmado, o acordo constituir­á a melhor notícia para PSDB e Geraldo Alckmin desde o início da corrida presidenci­al. Seu tempo de propaganda na TV crescerá de modo expressivo —os números exatos dependem da quantidade de postulante­s— e sua campanha ganhará maior enraizamen­to nos cenários regionais.

O preço desse acordo, em termos eleitorais, já está de certa forma contabiliz­ado. O ex-governador paulista não poderá se apresentar como um renovador dos costumes políticos ou um paladino da ruptura institucio­nal —imagem que nunca foi sua.

Seu desafio, nesse sentido, é o que acompanha toda a política brasileira: desvencilh­ar-se do lastro de atraso de um grupo de legendas cujo apoio nenhum governo, afinal, tem conseguido dispensar.

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