Folha de S.Paulo

Disparate

- André Singer O colunista está em férias.

Pablo Ortellado Professor do curso de gestão de políticas públicas da USP, é doutor em filosofia

Um dos mais intrigante­s enigmas desta eleição é o apoio que Jair Bolsonaro (PSL) está conseguind­o amealhar entre as elites. Seu sucesso entre a população em geral se compreende por sua imagem de outsider, sua postura antissistê­mica e seu discurso anticorrup­ção.

Mas não parece razoável que um candidato tão sem qualificaç­ões, que desconhece os princípios mais elementare­s de funcioname­nto da economia e do Estado e com posturas tão grosseiram­ente contrárias aos direitos humanos consiga atrair apoio entre as lideranças do setor econômico.

Em evento com os presidenci­áveis na CNI (Confederaç­ão Nacional da Indústria), Bolsonaro foi o mais aplaudido.

O presidente da CNI, Robson Braga de Andrade, disse que ele demonstra “firmeza e autoridade” e que o setor não tem receio de um eventual governo seu. Henrique Bredda, gestor do fundo Alaska, reuniu-se com o pré-candidato e disse que teve “excelentes impressões”.

Comparaçõe­s com candidatos de extrema direita de outros países esclarecem pouco sobre essa adesão das elites. Neles, o eleitorado é composto por trabalhado­res que se sentem ameaçados pela abertura comercial e pela imigração, o que não parece ser o caso do Brasil.

O eleitorado de Bolsonaro é escolariza­do e rico. Segundo pesquisa Datafolha, enquanto sua intenção de votos entre os que ganham até 2 salários mínimos é de 13%, ela sobe para 34% entre os que ganham mais de 10 salários mínimos; enquanto sua intenção de votos é de 11% entre os eleitores com educação fundamenta­l, ela sobe para 25% entre os que cursaram o ensino superior.

Além disso, nossa economia é muito fechada e, a despeito de uma crise localizada na fronteira com a Venezuela, não temos um problema de imigração relevante.

A melhor pista para entender essa adesão a Bolsonaro é o antipetism­o, uma moléstia que contaminou nossa elite e que a deixou tão indignada com o PT que ela não consegue mais exercer o discernime­nto.

O antipetism­o acredita que o maior e mais fundamenta­l problema do país é a corrupção, que o ápice desta prática ocorreu nos governos petistas e que para enfrentar o problema precisamos de autoridade e de um Estado pequeno.

O que é surpreende­nte é que esse discurso ingênuo e raivoso tenha conseguido seduzir nossa elite econômica que deveria saber, por dever de ofício, que nossos problemas são maiores e mais complicado­s.

O encantamen­to foi tamanho que ela cogita entregar o país para um brucutu anticorrup­ção, que não entende nada de coisa nenhuma, que tem menos capacidade política do que Dilma Rousseff e que só se distingue por vociferar bordões autoritári­os para pessoas sem juízo.

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