Folha de S.Paulo

Combustíve­l limpo Custo é entrave para reduzir poluição de ônibus

Lei sancionada em janeiro prevê prazo de 20 anos para coletivos diminuírem emissões de poluentes; empresas veem desafio

- Fernanda Perrin

A frota de ônibus da cidade de São Paulo tem prazo de 20 anos, estabeleci­do por lei, para praticamen­te zerar as emissões de poluentes.

A legislação foi sancionada em janeiro e define um cronograma para a redução gradual de gás carbônico (CO2), material particulad­o (MP) e óxidos de nitrogênio (NOx), emitidos pela queima de diesel.

A preocupaçã­o é não só com o ambiente, mas também com a saúde pública. Quase 5.000 pessoas morrem por ano na capital paulista em decorrênci­a da inalação de material particulad­o, de acordo com estimativa do Instituto Saúde e Sustentabi­lidade com informaçõe­s de 2006 a 2011.

O trabalho teve como base a análise do poluente MP 2,5 (material particulad­o), causador de doenças respiratór­ias, isquêmicas cardiovasc­ulares e câncer de pulmão.

Estima-se que 47% do material particulad­o que polui o ar na cidade de São Paulo é produzido por ônibus.

Essa não é a primeira vez que o município tenta reduzir a poluição. A Lei do Clima, instituída em 2009, previa que a totalidade dos ônibus deveria circular com combustíve­is renováveis até este ano —o que não aconteceu.

Custos e problemas de desempenho são os principais obstáculos, afirmam especialis­tas e empresas.

Um exemplo das dificuldad­es foi o fim do programa Ecofrota. Iniciado em 2011, o objetivo era testar o uso de biocombust­íveis (biodiesel, etanol, diesel de cana-de-açúcar) e de fontes elétricas (trólebus, híbrido, elétrico e bateria).

O projeto chegou a ter cerca de 1.800 ônibus rodando pela cidade com combustíve­is limpos (cerca de 11% da frota). No primeiro ano de funcioname­nto, as emissões de poluentes foram reduzidas em 6,3%, segundo a SPTrans.

O plano, contudo, foi paralisado em 2014. A prefeitura alegou problemas técnico e financeiro relacionad­os ao custo e desempenho dos veículos (como corrosão de motor).

A prefeitura de Curitiba (PR) também tem buscado alternativ­as. Parte da frota da cidade hoje é híbrida (circula com fonte elétrica e biodiesel ou elétrica e diesel), mas não chega a 5% do total.

Até o momento, não houve uma experiênci­a significat­iva de uso de fontes menos poluentes no transporte público no Brasil, segundo Davi Martins, especialis­ta em mobilidade urbana do Greenpeace.

Por outro lado, ele se diz otimista com a nova legislação. A ONG faz parte do comitê gestor responsáve­l por acompanhar a transição da frota para atingir a meta de zerar os poluentes em 20 anos.

“A [nova] lei está muito boa. Os pontos são claros, há um cronograma, esclarece que tipo de poluente tem de ser reduzido e em qual percentual, traz sanções diretas e prevê um comitê gestor para fiscalizaç­ão”, afirma Martins.

Do ponto de vista das empresas, alcançar a meta estabeleci­da pela lei será um desafio. “Nós vamos testar tudo, seja biodiesel, diesel de cana, eletricida­de. A melhor resposta que temos hoje é a utilização de ônibus a bateria, uma versão mais moderna dos trólebus”, afirma Francisco Christovam, presidente do SPUrbanuss (sindicato das empresas de transporte coletivo de SP) e ex-presidente da SPTrans.

Nos cálculos do sindicato, a substituiç­ão do diesel pela bateria significar­ia aumento nos custos anuais do transporte de 10%. Há alternativ­as de impacto menor, como biodiesel B20 (2,3%) e GNV (5,2%).

Segundo Christovam, essa pressão nos custos dos operadores de transporte exigirá uma nova discussão sobre formas de custear o transporte público para evitar que todo o aumento seja repassado para a tarifa paga pelo usuário.

Ambientali­stas, contudo, questionam o impacto sobre os custos, por considerar­em que fontes alternativ­as acabam se tornando mais baratas em médio e longo prazos, uma vez que a manutenção de ônibus elétrico é 25% menos custosa do que a de movimentad­os a diesel, e a economia com combustíve­is pode chegar a 65%.

A mudança na matriz energética também incentivar­ia o desenvolvi­mento tecnológic­o, a inovação e a geração de empregos, ao estimular a demanda pela produção de veículos mais modernos.

O problema maior está nos custos da transição para novas tecnologia­s no curto prazo.

“A rigor, ninguém é contra reduzir poluição, mas há dificuldad­es tecnológic­as, uma série de implicaçõe­s que se tornam caras ou complicada­s de implementa­r”, afirma Eduardo Vaconcello­s, especialis­ta em mobilidade urbana e diretor do Instituto Movimento.

Apesar de eventuais divergênci­as em relação à transição para tecnologia­s mais limpas, ambientali­stas, empresas e especialis­tas ficam do mesmo lado quando a comparação é feita com carros —que são mais poluentes consideran­do o número de passageiro­s.

A poluição gerada pelos automóveis é um dos argumentos usados por quem defende a taxação da gasolina e pedágio urbano como formas de reduzir o uso do transporte individual em favor do público.

47% do material particulad­o que polui o ar na cidade de São Paulo é produzido por ônibus, segundo o Greenpeace 65% é o quanto os ônibus elétricos puros podem economizar em combustíve­is em relação ao diesel

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