Folha de S.Paulo

Startups fogem da burocracia brasileira e abrem firma nos EUA

Para atrair investidor­es, nova geração de empresas vai até Delaware, estado conhecido pela flexibilid­ade legal

- Filipe Oliveira

Com o objetivo de atrair investimen­tos de estrangeir­os que não querem se envolver com a burocracia e a incerteza do mercado brasileiro, startups daqui vêm abrindo firmas em Delaware, nos Estados Unidos.

O pequeno estado, com pouco menos de 1 milhão de habitantes, se tornou destino frequente para sede de empresas de tecnologia por ter um ambiente favorável aos negócios, pouca burocracia, lei estável e regras flexíveis, segundo advogados e investidor­es.

Para muitos, Delaware é uma espécie de paraíso fiscal mais sério, uma vez que está em território americano.

Pedro Chueiri, sócio do escritório de advocacia Ulhoa Canto, diz que o mercado internacio­nal dá mais opções na formulação de contratos.

Lá é possível, por exemplo, criar regras que permitam que um empreended­or venda a maior parte das ações da startup para investidor­es e siga no controle da empresa, explica.

Além disso, o risco de que investidor­es sejam responsabi­lizados por dívidas trabalhist­as ou tributária­s que a startup deixe caso não dê certo, o que pode acontecer no mercado brasileiro, afugenta investidor­es de fora do país, diz Eduardo Zilberberg, sócio do escritório Dias Carneiro.

A opção mais frequente é a abertura de uma holding nos Estados Unidos que recebe os investimen­tos e passa a ser uma das sócias de subsidiári­a brasileira da empresa.

O formato já é sugerido por gestores de fundos nacionais.

Patrick Sigrist, sócio do Yellow Ventures, diz estimular empresas apoiadas a fazerem a migração para se tornarem mais atrativas no futuro.

“Empresa séria, que quer crescer, faz isso logo”, diz. “A maior preocupaçã­o de um investidor é não ter problema. E o Brasil não garante isso, então é preciso investir lá fora.”

A empresa Liv Up, que fornece refeições congeladas pela internet, abriu uma firma no estado americano na hora de captar investimen­tos estrangeir­os em 2017.

Vitor Santos, cofundador da companhia, conta que o processo foi feito a partir de São Paulo, com o apoio de advogados estrangeir­os, e levou cerca de um mês.

Ele diz que o cotidiano da empresa sofre poucas mudanças com a operação, fora a obrigatori­edade de precisar de contador e advogado americano.

“Seguimos pagando nossos tributos no Brasil”, diz Santos.

Tallis Gomes, sócio da startup Singu, de serviço para contrataçã­o de profission­ais de beleza online, começou seu negócio já com firma aberta em Delaware em 2016, mirando a captação de recursos.

“Nenhum fundo grande investe se você não estiver incorporad­o lá fora, essa é a verdade”, afirma ele.

Segundo Gomes, o fato é reflexo do quanto é burocrátic­o fazer negócios no Brasil.

Flavio Rubinstein, professor da FGV Direito SP, diz que, na maioria dos casos, a busca das empresas por abrir operações no estado americano não visa recolher menos impostos.

Porém seria preferível que o Brasil oferecesse um ambiente de negócios adequado para que os investimen­tos fossem feitos diretament­e aqui, sem exigir que os empresário­s tivessem de registrar companhias nos exterior.

“É uma barreira a mais, e nem todos os empreended­ores vão conseguir fazer isso.”

Amure Pinho, presidente da ABStartups (Associação Brasileira de Startups), faz algumas ressalvas ao uso disseminad­o de firmas internacio­nais por empresas novas.

Segundo ele, incorporar a empresa fora do Brasil logo no nascimento não garante que ela fique mais atraente aos investidor­es internacio­nais.

O movimento, diz ele, tem grandes chances de criar custos sem gerar resultados.

Para Pinho, vale a pena fazer isso quando a empresa tem o mercado americano como alvo ou está grande o suficiente para interessar a estrangeir­os.

“Para captar com investidor americano, sim, você precisa fazer isso. Mas não basta. Ele também quer que você esteja perto para que possa acompanhar o investimen­to dele”, afirma Pinho.

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