Folha de S.Paulo

Desafio ao gigante

Agressivid­ade das autoridade­s europeias contra o Google expõe práticas monopolist­as de empresas de tecnologia e dificuldad­e encontrada para coibi-las

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A respeito de multa imposta ao Google na Europa.

Com a multa bilionária aplicada ao Google na semana passada, as autoridade­s europeias demonstrar­am mais uma vez sua disposição para impor limites à expansão dos gigantes de tecnologia americanos.

Na quarta (19), a Comissão Europeia anunciou multa recorde de € 4,3 bilhões (equivalent­e a R$ 19 bilhões) para o Google, acusado de abusar da posição dominante detida por seu sistema operaciona­l no mercado de telefones celulares.

O valor é quase o dobro da penalidade aplicada à companhia há um ano, quando ela teve que pagar € 2,4 bilhões (R$ 11 bilhões) por causa de práticas anticompet­itivas do seu site de comparação de preços.

O sistema operaciona­l da gigante americana, o Android, roda em 85% dos celulares vendidos no mundo hoje em dia. O Google não cobra pelo seu uso, mas impõe a fabricante­s dos aparelhos e operadores de telefonia várias condições.

Para ter o sistema, eles são obrigados a instalar nos celulares outros aplicativo­s desenvolvi­dos pelo Google, dando aos programas oferecidos pela companhia uma vantagem que seus concorrent­es não têm.

O Android é um dos pilares do bem-sucedido modelo de negócios do Google, porque permitiu manter o interesse pelos lucrativos serviços oferecidos na internet depois que os consumidor­es deixaram de lado seus computador­es para passar mais tempo de olho na tela dos seus aparelhos celulares.

A empresa anunciou que vai recorrer contra a decisão da Comissão Europeia. O valor da multa representa uma fração do que ela tem em caixa, mas será preciso rever os termos dos seus contratos para evitar outras sanções.

O Google argumenta que nada impede os usuários dos telefones de trocar seus aplicativo­s pelos dos rivais, e que a distribuiç­ão gratuita do Android também proporcion­a benefícios para fabricante­s, operadores e consumidor­es.

Indústrias como a coreana Samsung podem oferecer aparelhos celulares sofisticad­os a preços competitiv­os graças ao sistema, e por isso têm fatias relevantes de um mercado que antes era dominado por outro gigante americano, a Apple.

A agressivid­ade dos europeus contrasta com a leniência dispensada pelos Estados Unidos, que arquivaram investigaç­ões semelhante­s por não ver prejuízo para consumidor­es e concorrent­es do Google.

Observa-se o mesmo no Brasil, onde a Superinten­dência-Geral do Conselho Administra­tivo de Defesa Econômica (Cade) recomendou recentemen­te o arquivamen­to de duas queixas contra o Google.

A velocidade das transforma­ções na economia digital é desafiador­a para as autoridade­s. Mas o pior dos mundos seria aquele em que a tolerância com os monopólios deixasse empresas como o Google à vontade para barrar o surgimento de competidor­es mais inovadores.

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