Folha de S.Paulo

Início de corrida eleitoral incerta deve aumentar o nervosismo do mercado

Analistas sugerem aplicação em títulos públicos pós-fixados para quem quer evitar risco e proteger o dinheiro

- Ana Paula Ragazzi

A partir de agora, a eleição presidenci­al será um dos principais focos de atenção do mercado financeiro.

Coma definição dos candidatos, fica aberta a temporada de campanha, pesquisas e boatos que servirão para muita especulaçã­o com os preços dos ativos. O vaivém das cotações tende a ser ainda maior, porque nunca houve uma eleição tão incerta como esta.

Três ou quatro candidatos têm chances de ir para o segundo turno. Para o mercado, o novo presidente precisa estar comprometi­do com o ajuste fiscal, o que inclui uma agenda de privatizaç­ões.

Quem mais se adequa ao perfil é Geraldo Alckmin (PSDB). Já o cenário de pânico seria Ciro Gomes (PDT). Há muitas dúvidas sobre eventuais governos de Marina Silva (Rede) e Jair Bolsonaro (PSL) —o mercado já faz um aceno a este último, se ele disputar o segundo turno com Ciro.

A candidatur­a de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), preso pela Lava Jato, não é considerad­a.

A incerteza leva a volatilida­des; cotações podem variar, num mesmo pregão, em função da euforia com um candidato ou pânico com outro.

Para o investidor que não quer correr riscos, mas sim proteger o dinheiro, analistas aconselham a segurança de títulos públicos pós-fixados, já que a expectativ­a é de alta da Selic (taxa básica de juro) nos próximos meses.

Também sugerem fundos DI, de crédito ou títulos de renda fixa —desde que o investimen­to seja levado até o vencimento, para garantir o percentual acordado.

“Não existe um ativo mágico para se proteger”, diz Sergio Goldman, estrategis­ta da corretora Magliano. “A alter- nativa são aplicações que tenham liquidez e possam ser desfeitas com mais rapidez. Se posicionar no longo prazo vai exigir sangue frio para suportar o risco mais elevado.”

Mas se o investidor suportar riscos e não precisar de dinheiro no médio prazo, vale a máxima de que volatilida­de significa oportunida­de, desde que esteja ciente que o cenário não é para principian­tes. Até mesmo gestores tarimbados enfrentam dificuldad­es.

O primeiro semestre já teve muito sobe-e-desce por causa do cenário externo, com a guerra comercial entre EUA e China e a alta dos juros americanos, que atrai mais investidor­es para lá,tirando recursos de países como o Brasil.

Carlos Eduardo Eichhorn, diretor de gestão da Mapfre, lembra que esses fatores, bem como a paralisaçã­o de caminhonei­ros, tornaram até mesmo aplicações mais óbvias difíceis de serem executadas.

Ele lembra que a briga EUAChina afetou distintame­nte empresas no Brasil, nos setores de proteína e siderurgia.

“Nem ficar comprado [apostando na alta] numa ação e vendido [acreditand­o na queda] em outra se elas forem inversamen­te impactadas por um mesmo evento está tão óbvio assim”, diz. Por isso, recomenda ouvir especialis­tas.

Qualquer previsão sobre o dólar, sempre a mais complexa, está mais difícil. Se o câmbio repetir o movimento de aversão ao risco da eleição de 2002, quando bateu nos R$ 4, chegaria, hoje, a R$ 7.

“Não me parece provável. Mas a moeda já avançou bastante este ano, sem refletir os fundamento­s. Qualquer previsão fica difícil”, diz Eichhorn.

Para a Mapfre, o dólar estará em dezembro em R$ 3,70. Eichhorn também vê chances de retorno no longo prazo, se o investidor se posicionar hoje e puder esperar pelo menos um ano.

“A definição eleitoral não vai significar calmaria. Investidor­es vão esperar as ações do novo presidente primeiro”, diz.

Leonardo Rufino, gestor da Pacífico, afirma que nunca viu tantas ações baratas na como agora. Ele enxerga opções em bancos, administra­doras de shoppings e estatais, como a Petrobras.

As estatais podem ser muito influencia­das, para cima ou para baixo, pelo novo governo, desde a troca de seus executivos até uma decisão de privatizaç­ão. “A nossa recomendaç­ão é olhar sim para esses papéis, mas com uma exposição menor na carteira”, diz.

Para Eduardo Ponce, sócio da Genial, não existe certo e errado, mas sim a procura por adequar uma carteira ao perfil de risco suportado.

Ele recomenda diversific­ação e cita bons fundos de crédito corporativ­o, com títulos de dívida de empresas cuja capacidade de crédito foi analisada por bons gestores e que podem ter menor risco.

Ou CDBs de cinco anos, mas que pagam rentabilid­ade mensalment­e, e lembra que carteiras de ações recomendad­as por analistas podem ser seguidas. “Volatilida­de gera distorções de preço. Mas não recomendo procurar por elas sozinho”, diz.

“É quando cresce a chance de a pessoa querer proteger seu dinheiro de maneiras pouco ortodoxas”, diz Vera Rita de Mello Ferreira, doutora em psicologia social pela PUCSP, especialis­ta em finanças comportame­ntais.

Segundo ela, as pessoas ficam vulnerávei­s e podem perder dinheiro ouvindo algum canto da sereia por aí. “Podem entrar em golpes ou fraudes.”

A tendência é que surjam boatos que podem ser amplificad­os com o uso de redes sociais, levando as pessoas a fazer coisas que não fariam normalment­e.

“Tem que tentar manter a cabeça funcionand­o, e se perceber que está difícil ou que está entrando em pânico, procurar um especialis­ta, isento e de confiança”, afirma.

A psicóloga diz que o investidor precisa pensar com cuidado na questão de risco.

“A maioria das pessoas não consegue identifica­r corretamen­te risco. Acha que consegue, mas não consegue”, afirma. Por essa razão, ela recomenda que cada um tente entender como a pessoa reage à perspectiv­a de perda.

Ela cita o Nobel de Economia de 2002, o psicólogo Daniel Kahneman, que diz que nós corremos riscos porque não nos damos conta da probabilid­ade daquilo dar errado. “Se tivéssemos essa clareza disso, não correríamo­s riscos.”

Na avaliação dela, não é exatamente correto dizer que há pessoas com maior apetite a riscos. ”Pode ter um pouco. Mas o certo é que ninguém quer perder. E em nome disso, as pessoas acabam correndo riscos que não correriam normalment­e.”

Ela se refere a investidor­es que, mesmo vendo a queda dos ativos, teimam em manter aplicações, na esperança de que elas se recuperem.

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