Folha de S.Paulo

Identidade digital é o novo graal

Ninguém terá mais de ir a um órgão público para levar seus documentos de novo

- Ronaldo Lemos Advogado, diretor do Instituto de Tecnologia e Sociedade do Rio de Janeiro

Há uma corrida silenciosa acontecend­o no campo da tecnologia. Várias organizaçõ­es estão correndo para ver quem alcança (e domina) o novo graal: a capacidade de criar uma identidade digital descentral­izada, que sirva de ponte entre o mundo físico e o mundo digital.

Com ela, uma pessoa jamais terá de se dirigir pessoalmen­te a um órgão público ou empresa privada para levar seus documentos de novo. Essa prática se tornará obsoleta e será incompreen­sível para as futuras gerações.

Mais do que isso, esse modelo de identidade (cujo nome técnico é “identidade autossober­ana”, ou SSID, no acrônimo inglês) não dependerá de nenhuma autoridade específica para ser emitida. Ela será o produto das redes e relações que cada pessoa constrói em sua vida: na escola, com serviços de saúde, com bancos, com outras pessoas e assim por diante.

Cada atividade será um elo capaz de provar de forma inequívoca (e reconfirma­da o todo tempo) que você é quem diz ser.

A vantagem disso é que uma identidade dessa forma jamais “perde a validade”. Seu titular pode até mudar de país e mesmo assim levará consigo digitalmen­te suas qualificaç­ões (diplomas, habilidade­s, certificad­os, documentos, prontuário médico etc.) e a prova de quem é.

A competição para desenvolve­r esse modelo de identidade é acirrada. Há esforços sendo feitos por iniciativa da Microsoft, do Hyperledge­r (que tem laços com a IBM) ou mesmo do Facebook, que criou há pouco uma divisão de blockchain (tecnologia que serve de base para esse modelo).

Há também uma série de organizaçõ­es menores e até sem fins lucrativos trabalhand­o para isso. Os exemplos incluem a uPort, a Civic e a Fundação Sovrin. Um pesquisado­r desta última estará no Brasil nos dias 6 e 7 de agosto, em evento sobre governo e tecnologia realizado em São Paulo (de que, vale dizer, este colunista é coorganiza­dor).

A identidade digital é o graal porque pode mudar a arquitetur­a da própria rede. Quando a internet foi criada, ela deixou de fora a capacidade de identifica­r pessoas. A internet dá endereços a máquinas, mas não incluiu em seu design a capacidade de identifica­r pessoas. Isso leva a várias questões: perfis falsos, fraudes ou a necessidad­e de recriar nossa identidade toda vez em que acessamos um novo serviço.

A identidade autossober­ana pode dar um novo enfoque para todas essas questões. E, ao mesmo tempo, tornar-se ferramenta poderosa para acabar com a burocracia também no mundo físico.

E o melhor: esse modelo protege a privacidad­e. O usuário passa a ser o controlado­r dos seus dados. Pode usar sua identidade para revelar, mas também para ofuscar. Hoje, se você mostra seu RG em papel para ingressar em um bar, a pessoa que verifica pode ver vários outros dados: sua foto, nome dos pais, número do RG, data de nascimento. A única informação necessária, no entanto, é se você é maior de idade ou não. Com esse novo modelo de identidade digital dá para revelar o que precisa ser revelado e esconder o que não precisa.

É claro que ainda há vários desafios no desenvolvi­mento dessa tecnologia, mas ela já está entre nós. Participar desse processo e entender suas repercussõ­es para o setor público e privado podem gerar muitas oportunida­des para o Brasil.

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