Folha de S.Paulo

Jornalista­s nicaraguen­ses não têm para onde fugir

- Fabiano Maisonnave

Na sala abafada, uma moradora de Masaya, conta, olhos marejados, como paramilita­res invadiram duas vezes a casa atrás do filho —líder opositor e pai de um universitá­rio morto nos protestos. De repente, o fotógrafo de um jornal local baixa a cabeça e começa a chorar.

Seu irmão, um dos manifestan­tes atrincheir­ados, estava desapareci­do havia um dia, desde a retomada da cidade, ao lado de Manágua, por policiais e paramilita­res do presidente nicaraguen­se, Daniel Ortega.

A sua colega de jornal o abraça e chora junto. A moradora tenta consolá-los. Todos moram em Masaya e não puderam sair de casa na véspera por causa da invasão, que deixou ao menos nove mortos. Ninguém me autorizou a citar nomes por medo de represália­s.

Dos pelo menos 360 assassinad­os em três meses de protestos pela saída de Ortega, um era jornalista. Ángel Gahona filmava, com celular, um banco depredado durante manifestaç­ão quando levou um tiro na cabeça. De Bluefields, na costa caribenha, transmitiu a própria morte.

Relatos de agressões e de equipament­os roubados são comuns. O cinegrafis­ta Jackson Orozco, do canal 100% Notícias, fraturou o nariz após ser golpeado por paramilita­res, que, encapuzado­s, circulam livremente pelas ruas empunhando armas de grosso calibre.

Cobrir a Nicarágua como enviado traz algum risco —duas equipes estrangeir­as foram intimidada­s com tiros de advertênci­a nesta semana. Mas contamos com as embaixadas e estamos de passagem. Os colegas locais não têm nenhuma instituiçã­o a quem recorrer nem para onde fugir.

“Todos os dias, antes de sair para trabalhar, mando uma foto para minha mãe”, me diz o repórter Wilmer Benavides, do canal 12. “Assim, ela saberá como estou vestido caso desapareça.”

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Issei Kato/AFP MASCOTES BATIZADAS Miraitowa (à esq.), da Olimpíada, e Someity, da Paraolimpí­ada (à dir.), passeiam em Tóquio neste domingo (22), dia em que seus nomes foram revelados
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Fabiano Maisonnave/Folhapress Com morteiro na mão, estudante acompanha enterro de colega morto em ofensiva paramilita­r

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