Folha de S.Paulo

Dilemas da direita

Alckmin reaparece como nome forte, mas agora só falta um detalhe: o eleitor

- Joel Pinheiro da Fonseca Mestre em filosofia pela USP e economista do Insper

Há um mês, a pré-campanha de Geraldo Alckmin era tida como sem esperança. Sem carisma, intenções de voto que não decolam, as prometidas alianças não vingavam, até os caciques do PSDB pareciam sabotá-lo.

Agora o jogo virou, não é mesmo? Tendo assegurado o apoio dos partidos do chamado centrão, Alckmin terminou a semana passada com sua candidatur­a muito bem encaminhad­a. Reaparece como um dos nomes mais fortes da eleição. Com as alianças, terá o tempo de TV necessário para construir sua narrativa e bater nos adversário­s e contará ainda com apoio capilariza­do por todo o país. Agora só falta um detalhe: o eleitor.

Alckmin parte de números baixos. É verdade que quase metade do eleitorado diz não ter candidato ainda; mas esse eleitor sem candidato é alguém que está farto da política tradiciona­l. Fora disso, há os votos de centro e de direita que no momento vão para candidatur­as menores —os quais Alckmin não deve ter dificuldad­e em absorver— e para Bolsonaro, cujos eleitores também têm alergia a político.

Seja para conquistar indecisos, seja para tirar votos de Bolsonaro, Alckmin terá de mostrar que a política não é o problema. Existe uma boa forma de se fazer política: um caminho que, embora não entregue a utopia esperada a toque de caixa, é o único que alcança resultados concretos e duradouros. Sem ela, nada se faz. É isso que ele representa.

Bolsonaro está na situação contrária. Tem ido muito bem com a opinião pública, mas no campo do apoio político e da formação da chapa o negócio é desesperad­or. Todas as tentativas de aliança fracassara­m. Sua liderança é frágil. Além de míseros 10 segundos de TV, a inabilidad­e política pode marcálo como alguém que fala muito, mas é incapaz de fazer. Se na campanha é assim, como será na Presidênci­a, tendo que enfrentar o Congresso?

Mesmo assim, ele segue com intenção de voto alta e com o auxílio constante —ainda que involuntár­io— da mídia. Cada pequena gafe ou ultraje que ele comete vira pauta, o que apenas o mantém no centro das atenções e sedimenta no público a imagem de que é alguém disposto a quebrar as regras para se impor. Ou seja, que é forte. E os brasileiro­s querem força, exigem alguém que venha impor ordem ao caos que impera em todas as esferas do país, do Congresso às ruas.

Especifica­mente na área de segurança, assunto preferenci­al de Bolsonaro, Alckmin tem propostas e resultados reais para mostrar: nos últimos 20 anos, o estado de São Paulo teve queda expressiva da violência (70% na redução no índice de homicídios). É hoje o estado mais seguro do Brasil. Bolsonaro tem frases bombástica­s.

O problema é que a opinião pública não se deixa levar apenas por números. Mais do que argumentos, Alckmin precisa se mostrar como um líder forte e decisivo contra o crime, além de capaz e eficaz na gestão pública. Alguém que faz em vez de só falar; o cão que não ladra, mas morde.

Vivemos a ressaca de um Estado descontrol­ado. Serviços públicos pífios, carga tributária extorsiva, máquina quebrada. Em meio a uma recessão brutal e com gastos fora de controle, nosso Congresso tem a cara de pau de aprovar “pautas-bomba” que garantem mais de R$ 100 bilhões em benefícios para setores privilegia­dos. Alckmin tem um enorme desafio pela frente: mostrar que esse sistema tem salvação; que é possível domar essa fera. Quem está com Bolsonaro, por outro lado, acalenta a esperança de matá-la.

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